O Brasil é sede, desde ontem, de um importante debate sobre
comunicação pública. O encontro, promovido pela Unesco e pelo governo
federal, poderia servir para uma reflexão sobre aquilo que é
comunicação institucional (estatal) e aquilo que é efetivamente
comunicação pública, algo ainda não vivenciado no País.
Primeiramente, vamos ao evento em questão: a representação da Unesco
no Brasil e a Empresa Brasil de Comunicação (EBC)/TV Brasil realizam o
Seminário Internacional de Mídias Públicas: Desafios e Oportunidades
para o Século XXI.
Na sede da EBC, em Brasília, estão alguns dos maiores especialistas
internacionais em radiodifusão pública, representantes de entidades e
dirigentes de empresas de comunicação da América Latina, dos Estados
Unidos e da Europa, para debater experiências de comunicação já
implantadas e o futuro destas mídias no século que se inicia. Serão
discutidos modelos de gestão, de financiamento, transparência,
autoregulação, manuais de jornalismo público, produção de conteúdos e
programação.
Feita a apresentação daquilo que está sendo discutido em Brasília,
chega o momento de fazer uma breve análise sobre a comunicação pública
praticada pela EBC, criada pelo governo federal em 2007 para gerir as
emissoras de rádio e televisão públicas federais, como a TV Brasil.
Trata-se de uma empresa de economia mista e que, supostamente, tem
autonomia em relação ao próprio governo federal para definir produção,
programação e distribuição de conteúdos no sistema público, que tem a
finalidade de prestar serviços de radiodifusão pública com o objetivo
de promover a cidadania.
O "supostamente" inserido no parágrafo anterior é, evidentemente, uma
ironia. Apesar de o governo federal pregar a independência da empresa
que ele próprio criou no segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT), uma simples olhada na página principal da Agência
Brasil - controlada pela EBC - deixa claro que não há independência
alguma e, portanto, não há comunicação pública, e sim estatal.
Às 17h30 de ontem, o primeiro bloco de notícias da página trazia em
destaque o texto "Emenda ao Código Florestal sinaliza permissão para
desmate, diz ministra", que apresenta ao público a visão da ministra
do Meio Ambiente, Isabella Teixeira, sobre a emenda 164 que permitiria
supressão de vegetação nativa.
O segundo bloco de texto anunciava: "Meta de inflação dará
flexibilidade ao governo, diz secretário". Mais uma vez a opinião
unilateral de um membro do governo, neste caso o secretário de
Política Econômica, Márcio Holland, relatava os pontos positivos das
ações do Executivo. O assunto em questão era a manutenção da meta de
inflação em 4,5% para 2013.
Finalmente, o terceiro e último bloco de notícias - desta análise -
relatava em tom jocoso uma declaração do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso (PSDB) sobre o decreto que permite manter em segredo,
por tempo indeterminado, documentos oficiais do governo.
"Ex-presidente diz que assinou sem ler decreto sobre sigilo", dizia o
título da matéria.
É um caso explícito de uso de um veículo público em favor dos
interesses institucionais e, pior que isso, partidários do atual
governo. Desde que a EBC foi criada, contrariando a premissa de
independência, o tom institucional da cobertura é notório. Se por um
lado a antiga Radiobrás nunca chegou perto de ser uma empresa de
comunicação que trata do interesse público como a britânica BBC o faz,
por outro, é inegável que houve retrocesso do primeiro para o segundo
mandato de Lula. Mudanças que talvez até tenham surgido como resposta
à grande Imprensa, mais alinhada naquele momento à oposição. Uma
explicação que não justifica a enorme falta que faz ao País uma
empresa que verdadeiramente faça comunicação pública.
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