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segunda-feira, 22 de março de 2021

O apagão: uma fábula.

Do lado de cá do Japão, na nossa República, o chefe maior é o Presidente que, ao ter a pretensão de ser a resposta de Asuma, ele se torna um plutocrata, um ditador, ou reinará como o Reizinho (The Little King, de Otto Soglow), um dos mais hilariantes personagens dos quadrinhos do século passado, que gostava de se comunicar com gestos pantomímicos. Reinou por quarenta anos amparado pelos jornais e revistas conservadores.

 

Por Aylê-Salassié F. Quintão* e Alexandre Q.F Quintão**

A nossa velha República não tem como dar resposta a este desafio que, no Japão, pertence ao mundo dos mangás, animes e otakus, porque não os leva a sério. Para os brasileiros, tecnologicamente ainda no cueiro, são perturbadoras, entretanto, as virtudes e as competências das tecnologias dessa quinta geração (5G) que está vindo por aí, propondo a troca de softs, conexões digitais inovadoras e a instalação de novas redes digitais.

O modelo é comandado pela mega fabricante chinesa Huawei que, por aqui, já detém o controle da Nextel e da Sercomtel, está presente em 65% da rede Vivo, 60% da OI, 55% da Claro e 45% da TIM (Wiziack,2021). Os Estados Unidos questionam o papel da empresa chinesa, e o Brasil, seguindo ainda a linha de Trump, transita refratário pelo ambiente, mas já cogitando de uma concorrência internacional para atualização e instalação de novas redes. Briga de “cachorro grande”: a China é o maior parceiro comercial do Brasil.

Em uma partida de Shogi, um jogo de xadrez japonês, entre um aluno e seu professor, o mestre pergunta: Shikamaru, se esse jogo fosse como a nossa vida, nossa vila, e acontecesse no contexto que vivemos, quem seria o Rei? Shikamaru é considerado um dos ninjas mais inteligentes do país do Fogo. Com o menor esforço, busca resolver problemas da maneira lógica, e ser o mais objetivo possível, responde: Ora, é o Hokage (o “presidente”).

O professor contesta: Numa primeira vista, parece mesmo o Hokage. Se por algum motivo, o Hokage é deposto do cargo ou se o rei morre, outro “Hokage’’ entra no trono e o jogo recomeça. Então é preciso proteger o rei pois, se for capturado o jogo acaba. Mas, quem é o rei, então?

Do lado de cá do Japão, na nossa República, o chefe maior é o Presidente que, ao ter a pretensão de ser a resposta de Asuma, ele se torna um plutocrata, um ditador, ou reinará como o Reizinho (The Little King, de Otto Soglow), um dos mais hilariantes personagens dos quadrinhos do século passado, que gostava de se comunicar com gestos pantomímicos. Reinou por quarenta anos amparado pelos jornais e revistas conservadores. Imaginação fértil, desafiava o protocolo e a realidade ao seu redor. Tinha família, conselho de ministros, exército, corte e súditos. A única figura que ali destoava era ele mesmo, o o rei, pouco afeito às convenções e às liturgias. Vivia criando situações embaraçosas.

São fábulas que ajudam hoje a compreender a realidade brasileira. O cidadão se aborrece e se diante de tantos reizinhos e visionários contando diferentes versões. A História mostra que o socialismo não deu certo por eleger como virtuosa a classe operária, ignorando os problemas ainda maiores que ela gera. O capitalismo, se perdeu ao produzir uma enorme exclusão social. O diálogo democrático entre os dois tende a não vingar porque são confrontos recheados de vícios retóricos, estigmas, fetiches e maldades com sentidos pré determinados, cujos ônus caem sempre sobre a sociedade, sem que alguém seja responsabilizado criminalmente.

Restam os reformistas conciliadores, temerosos das soluções violentas, propondo reformas políticas, ajustes nos sistemas de saúde, de educação, de humanização da cadeia produtiva, da propriedade da terra, etc. Tudo tende, entretanto, a ser apenas representado, como se fora mesmo um mangá capitaneado pelo jogo dos três poderes. Eles parecem um cemitério, onde toda a história se encerra e se enterra. Deve ser por isso que a maioria veste-se de preto. 

A história brasileira teve tempo e algumas oportunidades para passar por rupturas definitivas. Nada vingou, porque o sistema se ampara em uma estrutura social e mental canonizada por falsos profetas e enganosas interpretações. Foram tão bem configuradas ao longo da História que a tecnologia as disseca com rapidez e as deglute com facilidade. Na Austrália, o Google já controla 95% das buscas. O mundo atual, em processo distópico, está começando a ficar mesmo sob o controle das grandes plataformas digitais, modelos e ferramentas conectados dentro de um ambiente e que interagem entre si, buscando, criando valores e encripitando-os. Nossos arquivos pessoais, de empresas e governos vão sendo codificados, ininteligivelmente, por essas plataformas inclinadas a  retomar o caminho do mundo   em direção a paradigmas culturais novos.  

A tecnologia, sucedendo a si mesmo constantemente (1G,2G,3G, 4G, 5G), começa aos poucos a controlar o espetáculo social. Uma empresa estrangeira controla no Serviço de processamento (Serpro) do ministério da Fazenda o auxílio emergencial e as contas públicas. Agora chega aí, também de mansinho, uma tentação tão indigna quanto as atitudes do reizinho, que é o controle da inteligência nos centro de pesquisa e nas salas de aula digitais.

O impaciente Shikamaru, vê o mestre Assuma mal no leito de morte, e não resiste: “Quem é afinal o reiFala, quem é?. O mestre responde: “Ele não nasceu ainda”. As virtudes desta geração estão se apagando à espera da próxima.

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*Jornalista e professor; ** Fisioterapeuta, pós-graduado em gerenciamento estratégico de projetos.

sábado, 13 de março de 2021

A regionalização da produção pelas mãos do Cade

 

Programa Carrosel, na TV Brasília, marcou época na
transmissão local de conteúdos na Capital Federal

Avaliando as chamadas “condutas anticompetitivas” nos segmentos de TV aberta e por assinatura, o Cade aponta que a estruturação em redes, para efeitos de concentração, "é negativa, pois limita a variedade de conteúdo, sendo transmitida menos programação do que existiria, se cada geradora fosse diretamente responsável pelos produtos audiovisuais transmitidos".


Por Chico Sant’Anna*
Publicado originalmente no Observatório da Imprensa

 

 A Constituição Federal definiu, após mobilização da Fenaj, Fitert e Fitel, que a produção educativa, cultural e jornalística no rádio e na televisão deve ser regionalizada. O artigo 221, porém, nunca vigorou devido à falta de regulamentação. Não por falta de iniciativas. A pressão de grandes redes midiáticas e a chamada bancada da mídia nunca permitiram que isso acontecesse. Agora, estudo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade, órgão do ministério da Justiça com poder de avaliar a existência de cartéis e monopólios na economia brasileira, pode fazer com que a regionalização venha acontecer.

Desde 1988, a concentração da produção midiática se exacerbou, chegando ao rádio. Pela lei, não existe emissora repetidora de rádio. Todas são geradoras e, como tal, obrigadas a produzir localmente seus conteúdos. O modelo da TV, contudo, migrou pro rádio. Emissoras regionais passaram a ser simples retransmissoras da produção do Centro-Sul, notadamente, do Rio de Janeiro e São Paulo.

Avaliando as chamadas “condutas anticompetitivas” nos segmentos de TV aberta e por assinatura, o Cade aponta que a estruturação em redes, para efeitos de concentração, "é negativa, pois limita a variedade de conteúdo, sendo transmitida menos programação do que existiria, se cada geradora fosse diretamente responsável pelos produtos audiovisuais transmitidos".

Para o Cade, a concorrência pela audiência das programações só ocorre entre as cabeças de rede de abrangência nacional. "Historicamente, a última entrada significativa no mercado de cabeças de rede nacionais se deu em 1999, com a entrada da Rede TV. Portanto, tal mercado não é dinâmico. O mercado é também altamente verticalizado, uma vez que para se tornar uma cabeça de rede nacional, a empresa deve atuar simultaneamente nas etapas de transmissão de conteúdo, programação e produção de conteúdo", aponta o órgão.

Embora o Cade não mencione, há o inciso II, do artigo 221, até hoje desrespeitado, que prevê a produção independente que objetive a divulgação da cultura nacional e regional.

A bandeira da regionalização, levantada na década de 80 pelos trabalhadores do setor, tinha como pano de fundo preservar as diferentes culturas regionais, dar espaço a valores locais, evitar a pasteurização da informação, e fomentar maior geração de emprego e renda.

Gerações que nasceram após o advento das transmissões via satélite não vivenciaram os telejornais locais, que tratavam de temas locais, nacionais e internacionais. Tão pouco os programas musicais e humorísticos das diversas cidades. Aqui mesmo no DF, a TV Brasília embalou gerações com programas do tipo Carrossel, Quem Sabe Viaja. Nomes como Carranquinha e Titio Darlan encantaram milhares de crianças. Hoje, não teriam espaço na grade de programação.

Na música, valores locais como Ney Matogrosso, Cassia Eller, Paralamas do Sucesso, dentre tantos outros, só conseguiram vingar depois que migraram para o Rio e São Paulo e lá obter a visibilidade midiática que só as cabeças-de-rede propiciam. Até no Jornalismo, do Planalto Central, muita gente foi buscar espaço no Rio e São Paulo. Vide os casos recentes de Poliana Abrita e Tadeu Schmidt, mas no passado teve também Amália Rocha, Mauro Naves, Ana Paula Padrão, Leilane Neubarth, dentre vários e várias outras.

Para as empresas é mais barato produzir e mais fácil gerir uma só grade de programação, difundida nacionalmente. Se reduz custos, este modelo diminui a oferta de trabalho, a diversificação cultural e informativa e fortalece uma agenda temática formulada a partir de uma única perspectiva. Com as grandes redes, o caboclo da Amazônia sabe mais das enchentes do Tietê do que as dos igarapés amazônicos.

O Cade aponta ainda como condutas anticompetitivas os contratos de direito de transmissão de eventos esportivos. "Principalmente com relação ao abuso de poder econômico, abuso de posição dominante e acordo de exclusividade". Nos anos 70, em Brasília, podia se ver o futebol do Rio, na Globo, o paulista, na Bandeirantes, e o do Rio Grande do Sul, na TV Nacional – hoje TV Brasil – já que os generais de plantão apreciavam o futebol gaúcho. Hoje, na maioria dos casos, o jogo é um só para todo o Brasil. O espectador é obrigado a torcer ou secar times que não lhe dizem nada culturalmente.

Não se sabe até onde o Cade pretende levar suas conclusões. Pautaria o governo a disciplinar a regionalização da produção de rádio e TV? O momento atual, em que o Palácio do Planalto tem se bicado com a maioria dos grandes conglomerados midiáticos, pode ser um elemento motivador para que o Executivo proponha um novo modelo.

Pensar num país com as dimensões do Brasil com um só cardápio de conteúdos midiáticos é ruim e joga contra a criatividade regional. Entretanto, mudar de supetão as regras da produção teleradiofônica, principalmente depois dos efeitos econômicos da Covid, pode ser nocivo à maioria dos meios de comunicação e levar alguns à sucumbência.

Regulamentar o artigo 221 por “canetada”, seja medida provisória ou norma do Cade, não seria de bom alvitre. O Congresso Nacional é que deveria tomar à frente a responsabilidade. Junto com a regionalização, a exemplo do que ocorre em países como a França, deveria pensar também na regulamentação da distribuição de verbas publicitárias, públicas e privadas, para que mídias locais, regionais e nacionais sobrevivam. Lá, canais nacionais de TV, por exemplo, não veiculam propaganda do varejo. Essa publicidade cabe às mídias locais, impressas, radiofônicas ou televisivas. 

Mas esse é um debate mais profundo, que fica para outro artigo.

 

 

*Chico Sant’Anna é jornalista, documentarista e pesquisador em Comunicação, com Doutorado pela Universidade de Rennes 1 – França. Durante a Constituinte, era vice-presidente Regional da Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, tendo atuado diretamente nas gestões para a redação do Capítulo da Comunicação Social, na Constituição de 1988.

Um blog pra ouvir e falar com quem cuida


"Somos um país que está envelhecendo rapidamente e parte das cuidadoras familiares também precisam de cuidado. Mas pouco se fala sobre isso", lembra Ana Castro, outra jornalista de larga trajetória, aposentada, e também uma das coordenadoras do Coletivo.


Por Cosette Castro

Desde o dia 05 de março, um novo blog está disponível na internet. O Blog Coletivo Filhas da Mãe está hospedado na página do Correio Braziliense – clique aqui pra acessá-lo. Ele é fruto de um coletivo criado, no final de 2019, como uma rede de apoio a cuidadoras e cuidadores familiares de pessoas com demências e Alzheimer.

" Nossa proposta é olhar para quem cuida. O cuidado familiar é gratuito, invisível, pesado  e solitário", afirma  Cosette Castro, jornalista, psicanalista e pesquisadora, uma das coordenadoras do Coletivo. Segundo o IBGE, no Brasil 96% do cuidado de pessoas com demências e Alzheimer não remunerado é feito por mulheres. Muitas delas parentes: filhas, irmãs, sobrinhas.

Nas segundas, quartas e sextas-feiras o público poderá ler textos sobre envelhecimento, demências e Alzheimer, cuidado e autocuidado e também acompanhar dicas que facilitem a vida de cuidadoras e cuidadores familiares.

"Somos um país que está envelhecendo rapidamente e parte das cuidadoras familiares também precisam de cuidado. Mas pouco se fala sobre isso", lembra Ana Castro, outra jornalista de larga trajetória, aposentada, e também uma das coordenadoras do Coletivo.

Desde seu surgimento, o Coletivo Filhas da Mãe vem realizando várias ações para chamar a atenção sobre as demências, entre elas o Alzheimer - o tipo de demência mais conhecido - e também para promover o cuidado e autocuidado entre cuidadoras e cuidadores.

Em 2020, por exemplo, o Coletivo criou o Bloco das Filhas da Mãe e saiu pelas ruas de Brasília com a marchinha "Ninguém Solta a Mão de Ninguém".

Com a chegada da pandemia, o Coletivo incentivou cuidadoras e cuidadores de todo o país a contarem suas histórias através do celular no Projeto Filhas da Mãe Contam Histórias. A cada dia, durante 30 dias, uma história diferente – mas que tinha muito em comum com as demais -foi publicada, reunindo depoimentos de oito estados brasileiros

Em 2021, o Coletivo Filhas da Mãe realizou o III Sarau Virtual de música, prosa, poesia e afeto para homenagear o carnaval que não houve e lançou a marchinha " Vacina Sim!".

"É preciso recuperar a alegria, mesmo falando sobre temas sérios e dolorosos", diz Cosette Castro. Ela  conta que o Coletivo Filhas da Mãe está presente no mundo digital. Além do Blog, também está no Facebook (coletivo filhas da mãe), no Instagram (@blocofilhasdamãe), possui canal no YouTube (filhas da mãe). E em março lançou o Blog Coletivo Filhas da Mãe.

Ana Castro e Cosette Castro, uma gaúcha e uma bahiana, radicadas no Planalto Central, assinam os textos semanais e revelam que, em breve, terão convidadas e convidados escrevendo no Blog. " É uma construção coletiva, inclusive nas sugestões de temas", afirma Ana Castro, que possui longa experiência em blogs.