Em três anos e seis meses à frente da presidência da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), o jornalista Nelson Breve iniciou a reestruturação da empresa mas ainda não conseguiu decolar na audiência.
Para ele, a EBC é uma empresa em construção e isso levará tempo. Ele compara com os 80 anos da BBC britânica para se consolar. Nelson investiu pesado no planejamento estratégico e na formação dos profissionais.
Ele anuncia a instalação, no dia 25 de setembro, do Centro Roquete Pinto de Pesquisas, Desenvolvimento e Inovação em Comunicação Pública, em parceria com a Unesco. "Com esse Centro vamos experimentar e criar a cultura da inovação dentro da empresa. Não só na área da criação, mas também na área administrativa", afirma.
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Sobre esses assuntos e outros, como a chegada do sistema digital, cortes no orçamento e ética na profissão, Nelson Breve falou ao Jornal do Romário o seguinte:
JR – A ideia original à
época da criação da EBC é que ela se tornasse uma empresa pública, diferente da
estatal. Mas o problema principal sempre foi o da sustentação financeira.
Enquanto esse formato não chega o jeito foi submetê-la ao Orçamento da União. Como
ficaram os recursos da EBC depois dos cortes?
NB – Independência financeira é a
melhor forma e tem que se almejada, nós estamos trabalhando nesse sentido, não
com a velocidade que eu esperava, mas conseguimos dar um passo importante com a
liberação de parte da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública,
estabelecida pela Lei 11.652/2008. Ganhamos a ação na primeira instância [proposta
pelo Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e
Pessoal (Sinditelebrasil) que questiona a constitucionalidade da lei] e tem
entrado mais dinheiro.
Para 2015 tínhamos previstos R$ 627,5
milhões, incluindo os R$ 177,9 milhões que viriam da Contribuição. Mas o
governo contingenciou R$ 92,9 milhões porque o valor total da Contribuição não
era garantido. Logo, ficamos com apenas R$ 534,6 milhões, dos quais R$ 283,6
milhões são para pagamento de pessoal e benefícios. Sobram, então, R$ 251
milhões para custeio e investimentos.
A dificuldade é que estamos gastando o
dinheiro da fonte contribuição e menos da fonte do Tesouro. Está havendo uma
substituição e não um acréscimo.
JR – Mas e os cortes?
NB – A gente ainda não sabe porque
os 17,8% de recursos cortados da Presidência da República ainda não foram
distribuídos entre os diversos órgãos. Esses recursos destinados aos
investimentos são insuficientes se você levar em conta que nos últimos três
anos, saímos de R$ 100 milhões/ano para R$ 20 milhões/ano.
Os avanços tecnológicos depreciam em média
20% ao ano. Os equipamentos que adquirimos há cinco anos estão dois terços
depreciados e não conseguimos renovar o que é necessário. Se eu esperar chegar
no final, sem um certo padrão de investimento nas substituições teremos graves
problemas, já que o avanço tecnológico anda muito rápido.
JR – Quanto arrecada a Diretoria de
Serviços da empresa?
NB –Nós separamos essa Diretoria em
Serviços e Negócios a pedido do ex-ministro Thomas Traumann.Quem cuidava do
contrato com a Secretaria de Comunicação (Secom) era a Diretoria de Serviços,
lá eles reclamavam que não estava funcionando e nós reclamando que não
estávamos captando dentro das metas estabelecidas.
Embora tenhamos captado mais de R$ 100
milhões em 2013, no passado conseguimos algo em torno de R$ 90 milhões por ter
sido ano eleitoral e a legislação não permite investimentos do governo nessa
área. Recebemos R$ 20 milhões com a publicidade legal, R$ 50 milhões no
contrato com a Secom para alimentar o funcionamento da TV NBr, produzir a Voz
do Brasil e manter a cobertura da Presidenta com transmissões ao vivo em
qualquer lugar do Brasil e do mundo, mais a mídia impressa que ela recebe onde
quer que ela esteja. Cerca de R$ 20 milhões com captação de publicidade e apoio
cultural, mas perdemos com o clipping de mídia impressa.
Os jornais que utilizávamos para fazer o
clipping recuaram e tivemos menos conteúdos para oferecer. Por isso,
repactuamos alguns contratos e perdem os outros como os do Senado e da Câmara.
Agora os jornais estão voltando porque estão precisando de dinheiro. Fechamos
com o Globo, com a Folha, estamos fechando como Estadão. Falta ainda o Valor
Econômico.
JR – Isso se refere à Diretoria de
Serviços. E quanto à de Negócios, como é que está funcionando?
NB – Com o licenciamento de
programas, publicidade legal, captação via Lei Rouanet, todo potencial de
fontes de recursos externos. Um novo negócio, no entanto, pode ser executado
pela área de serviço.
Como não tenho equipe operacional, já
recusei contratos como os da TV Legislativa do DF, da Câmara Municipal de São
Paulo e vários outros. Enquanto nós não viabilizarmos a modalidade de
credenciamento, que já conseguimos junto ao Tribunal de Contas da União. Está
aprovado, em tese, o regime simplificado, mas o TCU ainda não devolveu
definitivamente a minuta corrigida.
Nossa programação não vende comerciais, mas
conceitos. Eu gostaria de fechar mais negócios na captação de apoio cultural,
mas eu não estou nessa área, quem cuida é o Gustavo Pinho, Superintendente de
Negócios, Marketing e Comunicação.
JR – Voltando aqui na questão dos
recursos da Contribuição. Quanto representou isso no seu orçamento?
NB – Esse dinheiro chega anualmente
em março. O recurso entra na composição do orçamento da União. Como disse,
estavam previstos R$ 177 milhões, mas na verdade chegaram apenas R$ 144
milhões.
Espero que o corte não saia dos R$ 85
milhões que sobraram, mas sim dos R$ 144 milhões já garantidos. É uma questão a
ser negociada ainda junto à Presidência.
JR – Bem, com tantas idas e vindas você
nem sabe quanto será o seu orçamento para este ano?
NB – Esse é um problema a ser
resolvido, mas é importante lembrar que se as empresas da Telecom desistirem da
ação judicial nós já temos depositado em juízo R$ 1,7 bilhão. Esse dinheiro
tende a vir para nós quando a sentença for transitada em julgado em segunda
instância, que ainda nem tem relator.
Espero que consigamos um acordo com os
empresários do setor para que eles desistam da ação e a gente possa fazer a
migração do analógico para o digital, já que são eles que vão operar a
transição.
JR –A EBC tem acesso aos índices de
audiência do Ibope para orientar sua programação? Quais são esses índices para
os diversos veículos (rádios e TV)?
NB – Os índices de audiência da
televisão nós temos de seis praças: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro,
Salvador, Recife e Porto Alegre. Nós ensaiamos uma elevação com a melhoria de
nossos sinais em digital, mas no ano passado tivemos problemas com a defasagem
tecnológica e com a manutenção dos equipamentos.
No Rio de Janeiro perdemos muita audiência
por conta de problema com os transmissores e com o retransmissor da Baixada
Fluminense. Em Brasília, que vinha aumentando bastante, também caiu. O fato é
que, mesmo assim, temos programas com audiência acima do traço em diversas
praças. A medição do Ibope pega todos os tipos de transmissão aberta,
parabólica e na TV por assinatura. O Ibope diz apenas que tantos domicílios
estão ligados na TV Brasil. Em Porto Alegre, depois que melhoramos a imagem o
Ibope aumentou. Então, há uma relação direta entre audiência e qualidade da imagem.
Como exemplo, no futebol, série C, o jogo
Guarani x Tupi superou 0,50% de audiência média em 4 praças: 0,90% em Recife;
0,82% em Salvador; 0,61% em Porto Alegre e 0,60% de média no Distrito Federal.
Outro tipo de audiência é o infantil Escola
Pra Cachorro, que superou 1,00% de audiência média em 2 praças: 1,29% no
Distrito Federal e 1,08% em Recife. Em outras duas, superou 0,50% em Salvador e
0,97% em Porto Alegre. Outro infantil, Escola Pra Cachorro é coprodução
brasileira e canadense.
No geral, em Salvador perdemos audiência.
Em Recife deixamos a audiência bem boa na época da série C do campeonato de
futebol, mas a universidade de lá, com quem temos parceria, também tem
dificuldade de investimento e essa situação não ajuda.
Em Brasília ainda tem o problema das
emissoras comerciais que estão operando numa potência mais elevada afetando a
nossa transmissão. Houve até um embate entre a SBT e a Record que tiveram que
chegar a um acordo para operar na mesma potência.
JR- E com relação às rádios?
NB - São sete emissoras de
rádio: Nacional Brasília FM, Nacional BSB AM, Nacional Rio AM, Nacional Alto
Solimões, Nacional Amazonas, MEC Rio FM e MEC Rio AM. Dentre essas, a MEC FM do
Rio e a Nacional FM de Brasília são as que têm melhor desempenho. O Ibope
aponta que a MEC FM tem 2.100 ouvintes/dia e a NACIONAL FM Brasília tem 2.578
ouvintes/dia em média no mês. As outras são bem mais fracas, variando de 886 a
68 ouvintes/dia no mês, em média.
JR – Ou seja, a audiência é baixa em
todo lugar. A TV Brasil está sendo transmitida pelo sinal aberto analógico em
quais praças? No resto do país tem quantas educativas e culturais estaduais são
conveniadas?
NB – No sistema analógico temos
Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e São Luiz. Em digital, temos Brasília, São
Paulo e Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre e Florianópolis. Parcerias no
digital: Natal, Salvador e Sergipe. Parceiros analógicos: TVEs do Rio Grande do
Sul, Paraná, Brasil Pantanal (MS), Rede Minas, Espírito Santo, Bahia, Sergipe,
Acre, Alagoas, Ceará, Pará, Piauí, Amazonas e Tocantins.
Com universidades também existem algumas.
Muitas dessas conveniadas têm programação local. Minas e Ceará, por exemplo,
produzem muito. Em outras praças têm apenas um jornal local e o resto da
programação é nossa, isso varia em cada caso.
JR - Quando sair o sinal digitalizado
haverá garantia de espaço para a TV Brasil? A EBC está participando da criação
do Canal Cidadania e do Canal da Educação no Ministério das Comunicações?
NB – Da criação não, que isso é
atribuição dos ministérios da Educação e da Cultura. As prefeituras sim
participam, o processo foi descentralizado para os municípios no caso do Canal
Cidadania. O que nós esperamos é que os espaços sejam disponibilizados para que
a gente possa operar de forma compartilhada, a mesma antena e um operador
único.
Investir em tempos de vacas magras será
sempre um problema quando a população está pedindo mais saúde, mais educação,
segurança. Mas dentro do governo está crescendo o entendimento de que é preciso
ter um sistema público de radiodifusão para que a sociedade receba conteúdos
mais adequados, plurais. Se haverá recursos para transformar essas ideias em
projetos, vamos saber nos próximos dois meses. Estamos discutindo o Plano
Plurianual de investimentos com os ministérios das Comunicações, Educação,
Cultura, Saúde e Desenvolvimento Social.
Estamos trabalhando muito fortemente para a
expansão da rede. No PPA anterior nós colocamos o operador e rede, mas ficamos
sem dinheiro. Nós mostramos para o governo que a TV digital pode ajudar muito
na difusão dos programas do governo de forma de interativa.
A ideia é implantar o Brasil 4D, que eu
acho ser o Pátria Educadora. É transformar o sistema digital no eixo do desenvolvimento
com democracia e diversidade. A comunicação digital, interativa, é o
desenvolvimento do capitalismo cognitivo, que organiza e disponibiliza o
conhecimento, como diz o sócio-economista francês Iann Boutang.
JR - Está garantido que a EBC terá acesso
ao sinal digitalizado, uma vez implantado definitivamente?
NB – Se tiver dinheiro, sim, só
falta canal para nós em Campinas. Lá é possível que a gente utilize em VHF,
pois já é possível em UHF. O VHF cobre uma área muito maior. Canais 7, 9, 11,
13 e 143 são VHF, a partir do 15 é digital UHF. O sistema analógico será
apagado quando entrar o digital. Será interessante todos operarem no VHF mas é
preciso que todos tenham uma antena híbrida, para que o telespectador não fique
trocando de antena. Com a híbrida, a transmissão alterna automaticamente as
frequências UHF e VHF.
A EBC tem preferência onde tiver um novo
canal disponível, antes de ele ir para o plano básico. Mas aqueles que já estão
ocupados, só a Justiça tiraria. Em Brasília todos os canais já estão ocupados,
inclusive pela TV Brasil e pela NBr.
JR - Vamos falar do Conselho Curador. As
nomeações dos novos conselheiros escolhidos no ano passado já ocorreram? Se
não, isso impede o seu funcionamento? Tem fundamento a alegação de que o governo
adiou as nomeações porque queria uma conselheira que não foi a escolhida?
NB - O Conselho funciona
normalmente porque há um dispositivo na legislação que diz que enquanto os
novos conselheiros não forem nomeados os atuais continuam exercendo o mandato.
Desconheço qualquer motivo para o atraso nas nomeações. Isso é normal nos
governos, veja por exemplo a nomeação do novo ministro para o Supremo Tribunal
Federal. Isso acontece, não há nada em relação a insatisfação com as escolhas.
JR - Qual o papel do Conselho Curador e
da Ouvidoria da EBC? Essas instâncias estão cumprindo o seu papel institucional
como deveriam?
NB – O Conselho vem cumprindo seu
papel, o projeto está em construção. Segundo Ignácio Ramonet a comunicação
pública nasceu tardia, muito depois da comunicação privada. Esse projeto EBC
vai levar 30 anos para ser consolidado. Faz parte do processo de
amadurecimento. A BBC tem 80 anos.
Nós somos muito novos nessa área. À medida
que vamos aprendendo é natural que o Conselho zele pelos princípios
estatutários. A mesma coisa com relação à Ouvidoria. Ela ouve a sociedade,
analisa as críticas à programação com base nos princípios e objetivos da lei,
faz sua crítica interna e apresenta seus relatórios ao Conselho Curador, que
por sua também faz sua análise.
JR - Já houve alguma mudança efetiva a
partir do trabalho da Ouvidoria ou do Conselho?
NB – A questão dos programas
religiosos. Nós estamos com novos programas com base nos debates do Conselho
Curador. O Comitê da Diversidade Religiosa, que o Conselho criou, ainda não
concluiu a conversa que deveria ter com os antigos programas. Eu estou
aguardando, até para assinar novos contratos, se for o caso.
JR - É verdade que há uma espécie de
terceirização da gestão com dirigentes de ONGs e Coletivos ocupando cargos de
direção ou de confiança dentro da empresa?
NB - Eu não sei de quem poderia
estar ocupando cargos com incompatibilidade. O que sei é que há um a lei de
conflito de interesses. Se existe e se está havendo conflito é preciso levar à
Comissão de Ética Interna da EBC ou para a Comissão de Ética Pública da
Presidência da República, dependendo do grau do cargo que ocupa. Se alguém acha
que tem isso é importante que faça a denúncia à Comissão de Ética. O empregado
tem que saber que quando ele tem qualquer vínculo desse ele precisa fazer
consulta à Comissão de Ética da empresa, que é integrada à Controladoria Geral
da União, ou à Comissão de Ética Pública da Presidência da República.
JR - O desenho empresarial da EBC, que
controla a TV Brasil, que é pública, e a NBr, que estatal, é viável?
NB – O grande problema é como
comunicar isso para a sociedade, que ainda não entende o que é a comunicação
pública. É preciso explicar. A sociedade, ou parte dela, acha que a comunicação
comercial já faz isso e não é verdade. Confunde-se muito o que seja a
comunicação governamental com a comunicação pública.
Quando foi feita a Constituição de 1988 acabou-se
por inventar esse conceito do formato compartilhado: público, privado e
estatal. O estatal tem que ser público, o que deveria ter sido definido é o que
é governamental e o que é público. O governo tem a obrigação de fazer a sua
comunicação sem filtro, diretamente. A comunicação pública é plural, não pode
ser apenas o ponto de vista do governo.
A comunicação comercial faz isso também, em
alguns casos sim, mas tem ali por traz os seus interesses econômicos e
empresariais. Se chegarmos algum dia que esse sistema compartilhado seja
possível, equilibrado, pode até funcionar. Aqui na EBC nós estabelecemos um
muro, quem trabalha para a TV Brasil não trabalha para a NBr.
Há uma separação de corpos, a área de
serviços cuida dessa relação com o governo e a área de negócios cuida das
outras funções com o público externo, está bem separado.
Ainda não é o melhor modelo, se se
separasse ficava mais fácil explicar para a sociedade. A lei não permitiu que
se fizesse uma subsidiária, talvez fosse o melhor caminho.
JR - A TV Brasil, há poucos dias,
apresentou uma boa reportagem sobre mobilidade urbana e, depois do Repórter
Brasil, um ótimo documentário sobre o Marechal Rondon. Esses programas não são
divulgados pela Rádio Nacional FM, por exemplo, que tem audiência qualificada
em Brasília. Por que a EBC não tem marketing cruzado? Os filmes, documentários
e reportagens especiais tinham que ser divulgados intensamente na rádio
Nacional, você não acha?
NB – Esse é um problema que é
recorrente. Quando a gente cobra, aparecem as chamadas. Depois vai diminuindo e
acaba. Essa é uma empresa que estava verticalizada em feudos conforme as
plataformas, sendo que plataforma web praticamente nem existia. Existiam duas,
a plataforma televisão e a rádio. Elas quase não se falavam, eram autônomas.
Criamos, em decorrência do planejamento estratégico de reestruturação, uma
Superintendência Executiva de Novas Mídias, para fazer a integração.
Estamos, assim, saindo de uma estrutura
vertical para a horizontal. Temos agora a produção jornalística e a artística,
a área de empacotamento e programação e a área de distribuição, e estamos
procurando integrar todas elas.
A Diretoria de Programação tem a
programação de rádio, de TV e de web. Portanto, ela é que deveria estar fazendo
o cruzamento. No jornalismo estamos integrando a Agência de Notícias com o
Portal e depois com as rádios. Estamos pensando em transformar a Nacional AM em
uma rádio só de notícias, ou criar uma rádio de notícias apenas na internet. E
depois vem a integração do telejornalismo. Hoje estamos estruturados para fazer
telejornal, não telejornalismo. Telejornal é o empacotamento do noticiário. O
telejornalismo é área de produção.
O mundo mudou, mas a EBC foi originada em
cima de duas estruturas rígidas, tanto a da Radiobrás quanto a da Fundação
Roquete Pinto, isso leva tempo para mudar. Os feudos são, às vezes,
impenetráveis. Os programas são pré-gravados e é difícil encaixar uma chamada
para a TV.
JR - Bem, produzir chamadas não é nada
complicado. Mas vamos falar sobre o Repórter Brasil Noite, que passa às 21h,
após o Jornal Nacional. Os dois têm um formato muito parecido, um apresentador
e uma apresentadora, chamadas, notícias cobertas, repórteres com a mesma
entonação. Esse horário é o melhor? A duração de quase uma hora é adequada?
NB - Muitas dessas perguntas
poderiam ser feitas para os diretores geral, de programação ou diretora de
jornalismo. Eu cuido da estratégia e do desenvolvimento corporativo. Eu delego
e cobro do diretor geral, mas vou respondê-las.
O direcionamento que dou pode até não ser
executado. Eu quero audiência, quero prêmios, quero prestígio e o resto fica
com o diretor geral. Se ele não executar o que espero que seja feito pode ser
substituído, com a concordância da Presidência da República, que nomeia, e do
Conselho Administrativo.
Eu discordo da crítica de que o jornal é
muito longo, parece cansativo porque os outros jornais, que são feitos da mesma
forma, foram criados para ter meia hora. Mas eu posso ter um jornal mais longo
com o assunto quente do dia contando com a colaboração de meus parceiros nos
Estados, com entrevistados e debates mais profundos. Eu regionalizo o debate
nacional nos locais para onde estou transmitindo o Repórter Brasil.
Quando eu tomei posse pedi criatividade e
ousadia, mas acho que elas avançaram pouco em algumas áreas. As limitações
técnicas e de pessoal são naturais, precisamos formar as pessoas.
No dia 25 de setembro, dia do aniversário
de 131 anos do Roquete Pinto, vamos inaugurar, em parceria com a Unesco, o
Centro Roque Pinto de Pesquisas, Desenvolvimento e Inovação em Comunicação
Pública. Com esse Centro vamos experimentar e criar a cultura da inovação
dentro da empresa. Não só na área da criação, vale também para a área
administrativa.
JR - Mas a mudança do horário do jornal
faz parte desse debate?
NB - Estamos discutindo e é
possível que a gente traga o jornal para mais cedo. A dúvida é se devemos
competir com o Jornal Nacional. Eu acho que tem que competir mesmo.
JR - Os assuntos do dia são os mesmos. O
telespectador que já viu o Jornal da Band, o JN, não vai para um terceiro
jornal para ver as mesmas notícias. Se fosse um jornal com coberturas
diferenciadas talvez pudesse ser mais atrativo.
NB -O nosso telejornal é o que tem
os maiores índices de audiência dentro da nossa programação. Os programas
infantis, o Caminhos da Reportagem, que é referência hoje, e o Repórter Brasil,
são os carros chefes da programação. E é isso mesmo o que deve ser a
comunicação pública.
JR - Faz parte da missão do jornalismo
da EBC não defender os pontos de vista do governo nem da oposição. A ideia
seria a busca da imparcialidade? Existe imparcialidade?
NB - Eu te asseguro que ela
existe. O que existe também é que as pessoas cometem erros. Nós temos um orientador
que é nosso Manual de Jornalismo, diferente dos manuais de redação. Lá estão
todas as orientações, os princípios que precisam ser seguidos, fora os
princípios previstos na nossa Lei de criação. Jornalismo de mais ninguém está
previsto em lei, o nosso está, porque fala em pluralidade, equidade etc.
Nosso manual foi bem construído,
inspirou-se em parte no manual do jornal espanhol El País e busca a definição
do que é jornalismo. É isso que vai fazer a gente ter credibilidade e ser
referência.
O Centro de Pesquisas Roquete Pinto vai
proporcionar a formação de uma doutrina jornalística, junto com o que será
feito na nossa área de educação corporativa para capacitar, qualificar as
pessoas que estão aqui.
É preciso compreender que quanto melhor o
jornalista menos cidadão ele é. O contrato que ele faz com a sociedade exige
que ele forneça todas as informações para que as pessoas formem o seu próprio
juízo. O interesse de classe de um determinado jornalista é diferente do de um
outro cidadão. O militante, e eu não sou contra qualquer tipo de militância,
prejudica o exercício profissional se ele deixa a sua militância contaminar o
seu trabalho jornalístico, qualquer que seja ela.
JR - O Brasil tem alguma chance de um
dia chegar ao nível de excelência de uma BBC? Quais os caminhos para nos
aproximarmos da emissora da Inglaterra?
NB -Como princípio sim, como modelo
não. O Reino Unido é um Estado muito menor que o nosso. Acho que a Public
Broadcasting Service (PBS), dos Estados Unidos, é o mais adequado. O ideal
seria misturar a BBC, a PBS e a NPR, National Public Radio. também dos EUA. O
jornalismo da PBS é bom, mas o da NPR é muito melhor, até mesmo que o da BBC.
Se juntarmos isso, seremos referência no mundo como comunicação pública. A NPR
é ágil, toca em todos os pontos, não poupa ninguém, nem persegue ninguém.
JR - Eles são autosustentáveis?
NB -Não são, eles têm recursos
públicos também. Nos EUA existe um sistema que permite que as pessoas doem
dinheiro de herança para sustentar esse tipo de atividade pública. Existem
fundações que apoiam e têm muitos fundos para isso, mas tem complemento de
recursos do Tesouro da União, dos municípios e dos Estados.
JR - TV Internacional vai bem?
NB -Ela está funcionando, mas a TV
Internacional não pode ser entendida como apenas um projeto da comunicação
pública, ela tem que ser entendida como um projeto do Estado brasileiro para
vender a imagem do Brasil no exterior. Se não houver recursos adicionais para
isso, vai ficar do jeito que está. Ela é vista em 65 países e temos alguns
problemas de direitos autorais que nos impedem de passar no exterior, mas a
maior parte é a mesma programação da TV Brasil. Alguns programas são feitos
especialmente para a TV Internacional.
JR - Você é candidato a ser reconduzido
à presidência da EBC, em outubro?
NB - Não, é uma decisão que já
tomei, um mandato é o suficiente para mim. Aliás, o Congresso está acabando com
a reeleição, né? Eu acho que é preciso mudar para oxigenar, tanto para
preservar a saúde, o convívio familiar de quem está na função, quanto para a
empresa que precisa dinamismo para seguir o que já foi construído e fazer
avançar, mexendo em áreas que às vezes ficaram abandonadas. Não há candidato à
vista, se me consultarem posso indicar bons nomes, mas quem vai decidir é a
presidenta Dilma Rousseff e o ministro Edinho, da Secom.
JR - Quais são os seus planos para o
futuro?
NB - Tenho um projeto que carrego
comigo antes de vir para cá, que é ser roteirista de séries para TV. Interrompi
essa ideia ao ser indicado pela ex-presidenta Tereza Cruvinel para assumir a
presidência da EBC. Antes disso, cheguei a ser assessor da Diretoria e
Superintendente de Comunicação Multimídia. Eu gosto muito desse modelo de
séries televisivas, é uma área que caiu no gosto popular no mundo inteiro.
Outra área interessante são esses realities shows de culinárias, são uma febre.
Não sei se terei talento para tudo isso, mas vou investir nessa área e me
profissionalizar.
___________________
Quem é Nelson Breve?
O jornalista Nelson Breve é diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) desde novembro de 2011. Formado pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), iniciou a carreira profissional há 20 anos, como redator e repórter do Diário do Grande ABC, de Santo André (SP).
Antes de concluir o curso, trabalhou por quase sete anos no Banco Bradesco S/A, onde chegou a exercer a função de analista de gestão das agências e diretorias das regiões Norte e Centro-Oeste, no Departamento de Gerência Geral.
Atuou como repórter no Diário do Povo, de Campinas (SP), e nas rádios Eldorado, de São Paulo (SP), e CBN, de Brasília (DF). Entre 1997 e 2002, foi repórter de economia e política da Agência Estado, acompanhando diariamente o Congresso Nacional por mais de quatro anos. Também trabalhou no Jornal do Brasil e na Agência Carta Maior, onde coordenou a instalação do escritório de Brasília.
Em 2005, foi gerente da Assessoria de Imprensa da Unidade de Comunicação Social da Confederação Nacional da Indústria (Unicom-CNI) e assessor de imprensa do ex-deputado José Dirceu.
Trabalhou como secretário de Imprensa da Presidência da República, no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado do ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Franklin Martins.Antes de assumir a Presidência da EBC, trabalhou na Empresa como assessor de Diretoria e superintendente de Comunicação Multimídia.