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quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Há 40 anos, mataram o Mário Eugênio

Perto da meia-noite de um domingo, Marão saía do Setor de Rádio e TV Sul de Brasília, após gravar seu programa de rádio. No térreo, enquanto abria a porta do carro para ir embora, foi atacado por indivíduos em dois veículos da segurança pública.

 

Por William França, publicado originalmente no Correio da Manhã - edição DF, coluna Brasilianas

Dia 11 de novembro, completaram-se 40 anos de um fato histórico que abalou Brasília: a morte do jornalista Mário Eugênio. Ele era um verdadeiro mito da reportagem policial. Escrevia no “Correio Braziliense” e tinha um programa diário da Rádio Planalto, o “Gogó das Sete”, líder de audiência.

Em 1984, no último ano da ditadura, ele teve coragem de denunciar um Esquadrão da Morte montado por militares do Exército e policiais do DF, que praticavam crimes diversos.

Mário Eugênio acabou recebendo um tiro de escopeta na cabeça e outros cinco tiros no corpo. Foram disparados pelo atirador de elite conhecido nos meios policiais como Divino 45.

Perto da meia-noite de um domingo, Marão saía do Setor de Rádio e TV Sul de Brasília, após gravar seu programa de rádio. No térreo, enquanto abria a porta do carro para ir embora, foi atacado por indivíduos em dois veículos da segurança pública.

Este colunista, à época estudante de Jornalismo no CEUB, era um ouvinte do programa. Acompanhou o noticiário pelo que a equipe do “Correio Braziliense” divulgava – embora, naquela época, não se soubesse tanto dos bastidores.

Hoje, sabe-se que a investigação do crime se deu pelos jornalistas do Correio. Rendeu perseguições, ameaças de morte e um trabalho de abafa por parte das autoridades da Secretaria de Segurança do DF e do Exército. Mas também rendeu um Prêmio Esso Nacional à equipe do jornal (o maior prêmio do Jornalismo brasileiro) e o Prêmio Herzog de Direitos Humanos, da Arquidiocese de São Paulo.

Toda essa história, rica em detalhes, está contada por um dos mais envolvidos em toda a apuração e resolução do crime, o jornalista Renato Riella. Então secretário-executivo de Redação do “Correio Braziliense”, ele chegou no local do crime quando Mário Eugênio ainda sangrava. “Brasilianas” reproduz o relato de Riella na versão digital da coluna.

 Acesse o link da coluna do jornal e boa leitura!

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Pecados do conservadorismo católico: a visão poética da jornalista Raíssa Abreu


Na Capital Federal, jornalista e escritora mineira lança livro de poemas autobiográficos que expõe pecados do conservadorismo católico do interior


Objeto estranho, recém-editado pela Patuá editora, é uma obra autobiográfica que traz cenas da infância e da adolescência da escritora e jornalista, Raíssa Abreu, 43 anos, reelaboradas numa linguagem onírica a partir de objetos que evocam lembranças, como um snoopy de pelúcia, um clichê de jornal, um monóculo, um terço, um par de sapatos. O cenário é uma comunidade católica tradicional do Sul de Minas Gerais.

Num cenário sombrio-kitsch, de múltiplos silenciamentos e mortes anunciadas na torre da igreja, são esses seres inanimados o pretexto para falar, ainda que pelas beiradas, de assuntos incômodos - a pobreza, a misoginia, a meritocracia, a intolerância, o suicídio - e para insinuar visadas menos trágicas sobre as personagens.

Sinopse

A subversão maior é aquilo que escapa à língua, que fica em algum lugar entre o fim de um verso e o tropeço de outro. No desencontro entre palavra e imagem. O segredo da moça do cabelo alisado. A ave-maria perdida no terço.

A trajetória de um corpo estranho pela vidamorte de uma família cristã numa cidade do interior, marcada pela vigilância da tradição e pela meritocracia. O que pode acontecer à hierarquia bem marcada entre os pontos que giram ao redor do objeto totêmico quando alguém olha para a torre da igreja e enxerga a ponta de um lápis?

"A escrita de Abreu, afeita ao nervo da linguagem, estranhamente torna o simples algo escorregadio, que conduz a uma imersão em imagens pouco vistas, pois os objetos aqui são ricamente ativados pelo que extrapolam em relação às suas acepções, enviesando à imaginação o ordinário e o transformando em preciosidade" (da orelha de Léo Tavares).

A autora

Há 19 anos em Brasília, Raíssa Abreu é jornalista e estuda Letras na UnB. Nascida em em Pedralva, sul de Minas Gerais, teve uma infância em uma casa lotada de papel-jornal e de imagens de Nossa Senhora. Hoje, faz parte do coletivo de poesia cerratense Nexo Grupal.

Objeto estranho é seu livro inaugural. O lançamento acontece na quinta-feira (31/10), a partir das 19h, no Quanto Café, e contará com uma conversa mediada pelo escritor e artista plástico, Léo Tavares, (“Situações” e “O Congresso da Melancolia”) . O bate-papo será seguido de sessão de autógrafos.

Serviço:

  • O que?  Lançamento da obra Objeto Estranho - Ed. Patuá.
  • Quem?  Raíssa Abreu
  • Quando?  31/10, quinta-feira, às 19h
  • Onde?  Quanto Café CLN 103, Bl A

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Jornalismo: Brasil, Israel e a pós-verdade


O Exército Brasileiro negociava a compra de 36 unidades de um tipo de
blindado voltado para a artilharia pesada,  de uma empresa israelense,
mas a negociação  foi suspensa após um impasse diplomático.
O momento de polarização política vivido pelo Brasil desde 2009 criou um novo movimento jornalístico: a pós-verdade. É uma atualização de um velho ditado corrente na imprensa que diz:

— Não deixe que a realidade fique entre você e uma grande manchete.



Por Pedro Paulo Rezende


Claro, era uma brincadeira, mas deixou de ser.

A pós-verdade e o excesso de criatividade viraram armas dos jornalistas de direita. A maioria deles, aliás, já abusava de fake news desde a campanha eleitoral de 2018. Por outro lado, os militantes de esquerda atuam nos fóruns de WhatsApp pedindo ações mais contundentes e completamente fora da realidade contra o Ocidente, como o corte de relações diplomáticas com Israel e os Estados Unidos.

Podemos analisar isto na campanha jornalística para tentar reverter a decisão do governo de congelar o processo de aquisição pelo Comando do Exército de 36 obuseiros de 155 mm autopropulsados sobre rodas (Programa VBCOAP 155 SR) — vencido pela empresa israelense ELBIT, que ofereceu o ATMOS em uma versão específica para o Brasil. O motivo para a decisão é que as relações entre Brasil e o Estado de Israel nunca estiveram em um patamar tão baixo.

Antes de tomar a decisão, o presidente da República, Luíz Inácio Lula da Silva, ouviu o ministro das Relações Exteriores, embaixador Mauro Vieira, e o assessor especial de Assuntos Internacionais (e ex-ministro da Defesa), embaixador Celso Amorim. É preciso ressaltar que ambos fazem uma distinção entre o governo do Estado judeu, hoje nas mãos de Benjamin (Bibi) Netanyahu — um radical supremacista —, e o país. Por isto, as relações diplomáticas com Israel não foram cortadas.

O congelamento da licitação, decidido depois de várias ações hostis do governo de Israel, não chega a prejudicar o programa do Comando do Exército de forma irremediável. Os termos do contrato preveem o envio de duas unidades para testes nas condições brasileiras antes de se firmar o documento definitivo. Caso as relações não se normalizem ainda haveria a possibilidade de se contratar, em análise pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o segundo colocado — o Zuzana, da empresa eslovaca Excalibur.

Este quadro inspirou um jornalista de direita (condenado por fake news) para lançar uma pós-verdade: as Forças Armadas nacionais irão retirar todos os equipamentos comprados de empresas israelenses de seus navios, viaturas e aviões para substituí-los por equipamentos chineses e russos, o que paralisaria Marinha, Exército e Aeronáutica. Ele se aproveitou de um fato real para, com criatividade, lançar uma fake news. O comandante do Exército, general de exército Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, irá visitar a República Popular da China onde poderá assinar acordos de cooperação entre os dois países.

Há uma grande distância entre os dois pontos, o que apenas demonstra o grau de loucura causado pela radicalização política do país.

Crise

Não faltaram artigos contrários ao presidente Luíz Inácio Lula da Silva quando ele denunciou, em fevereiro, o massacre da população civil em Gaza pelas Forças de Defesa de Israel. A declaração foi dura e comparou os bombardeios israelenses às ações de Hitler contra os judeus. Na época, os meios de comunicação nacionais classificaram a fala como um apoio velado ao terrorismo e ignoraram as contínuas declarações anteriores em que ele responsabilizou o Hamas pelas 1.280 mortes de civis no ataque cometido em território israelense no dia 8 de outubro de 2023.

Em resposta, o ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, impôs um constrangimento ao então embaixador brasileiro, Frederico Meyer. Em lugar de uma reprimenda fechada, como é comum na diplomacia, escolheu o Museu do Holocausto, em Jerusalém, como palco. O evento foi público, o que contraria as regras internacionais. O chanceler israelense ainda declarou o presidente Lula “persona non grata”.

A reação internacional mostrou quem estava certo. Na Organização das Nações Unidas (ONU), a maioria dos países se alinhou com a posição brasileira, que reconhece a existência da Autoridade Palestina como governo legítimo da Cisjordânia e de Gaza e considera as ações de Israel em Gaza como crime de guerra. O Tribunal Penal Internacional (TPI) condenou Bibi Netanyahu à prisão, junto com quase todo o gabinete de governo formado pela coalizão de direita israelense.

Militontos

Para a direita radical, os interesses de Brasil e Israel se confundem. Os radicais conservadores gostariam que o Ministério das Relações Exteriores endossasse in totum as ações do primeiro-ministro do Estado judeu, Bibi Netanyahu, que determinam a eliminação de civis por ataques aéreos indiscriminados. Para esta turma, o presidente Luíz Inácio Lula da Silva não poderia denunciar o genocídio de 50 mil palestinos (26 mil deles crianças) e deveria seguir cegamente as determinações de Telavive (não reconhecemos Jerusalém como capital).

É bom lembrar que boa parte dos militontos da direita brasileira é formada por religiosos neopentecostais que acreditam ser o Estado de Israel a concretização de profecias bíblicas que afirmam que o Terceiro Templo será reconstruído e servirá de palco para a nova vinda do Messias. A segunda parte do texto, que não é canônico (surgiu nos Estados Unidos ao final do século 19), mas é amplamente aceito pelas Assembleias de Deus, normalmente não é citada: o templo será destruído e a maioria dos judeus será exterminada em uma guerra onde a Cristandade vencerá e o restante da população hebraica se converterá a Cristo.

O grau de loucura dos militontos vai mais além e chega ao cúmulo de afirmar que o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin (conservador e ligado à Igreja Ortodoxa Russa) é um representante do comunismo internacional e que a República Popular da China quer colonizar o Brasil.

É preciso ressaltar que a “militôncia” de esquerda não fica muito atrás. Em um fórum de discussão no WhatsApp, um participante afirmou que a posição neutra do presidente Luís Inácio Lula da Silva sobre as eleições da Venezuela deveria resultar na retirada do Brasil do BRICS Plus, como se fosse possível expulsar do bloco um membro fundador. Outra bobagem comum é a teoria da conspiração de que o atual governo estaria prestes a assinar um acordo para integrar a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e se afastaria da China, nosso maior mercado, e da Rússia.

Até a queda no banheiro do presidente Lula ganhou uma versão conspiratória: a de que ele fingiu o acidente para não participar diretamente da Cúpula de Kazan que reunirá os países do BRICS. É normal nestes casos que o paciente fique, no mínimo, 48 horas em observação. Além disto, o avião presidencial sofreu uma pane e se encontra em reparos na Cidade do México. O substituto fabricado pela Embraer possui uma autonomia inferior e exigiria mais escalas.

Em função dos dois grupos, criei uma versão atualizada de O samba do crioulo doido, de Stanislaw Ponte Preta: O funk do militonto mentalmente perturbado. Precisamos nos afastar destas visões para não perdermos a sanidade.

A verdade

Em qualquer país que se preze, a diplomacia está acima das autoridades militares. É preciso lembrar que foi o governo israelense que levantou a voz de maneira desproporcional e, além disto, em represália, dificultou a saída de cidadãos brasileiros de Gaza. Para o Itamaraty, fica difícil fazer negócios com um vendedor que dá caneladas por baixo da mesa.

Este histórico foi ignorado pelo Comando do Exército ao escolher o ATMOS proposto pela empresa israelense Elbit como vencedor da concorrência.

O ministro da Defesa, José Múcio, ignorou este ponto e saiu a campo para tentar reverter a decisão do presidente da República. Além disto, criticou o Itamaraty por impedir a venda de material excedente do Exército Brasileiro para a República Federal da Alemanha (que seria repassado para a Ucrânia, que está em guerra com a Federação Russa). Os diplomatas da Divisão de Produtos de Defesa (DIPROD) — junto com os técnicos da Secretaria de Produtos de Defesa (SEPROD) do Ministério da Defesa — impediram o negócio. Afinal de contas a neutralidade absoluta em conflitos é uma das bases da política externa nacional desde os tempos de José Maria Paranhos Jr., o Barão do Rio Branco.

O ministro José Múcio disse que a recusa era ideológica. Alegou que o negócio, que envolvia a venda de 60 mil projéteis antiaéreos de 35 mm ao preço de US$ 20 milhões, foi negado porque prejudicaria a compra de fertilizantes e diesel da Rússia. No entanto, ele se esqueceu de mencionar que o Itamaraty negou uma proposta de Moscou para recomprar as doze células de helicópteros Mil Mi-35 (de fabricação russa) encostados pela Força Aérea Brasileira, por US$ 25 milhões a unidade.

Hoje, a diplomacia israelense está sob o controle de colonos que ocupam ilegalmente terras atribuídas pela Organização das Nações Unidas (ONU) ao futuro Estado Palestino. Para sobreviver politicamente, Bibi Netanyahu (indiciado por corrupção) necessita ampliar conflitos, o que explica os ataques ao Irã, ao Líbano e à Síria. O primeiro-ministro israelense se apoia em uma base parlamentar formada por defensores do Grande Israel, que incluiria a limpeza étnica em Gaza e na Cisjordânia. É uma tragédia de grandes proporções e a posição do governo brasileiro se justifica e está acima da ideologia.

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

EBC: jornalistas aprovam paralisação para 3/9


Por Chico Sant'Anna

Se as deliberações se confirmarem, na terça-feira, dia 3, os radiovintes não ouvirão o tradicional "Em Brasília, 19 horas".  Os jornalistas decidiram  por uma paralisação de um diam em resposta a posição da direção da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) tentar contornar a obrigação do respeito à jornada de trabalho de cinco horas diárias e limite de 30 semanais, conforme prevê a CLT. Reunidos em assembleia em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo, os profissionais entenderam a postura da EBC como um "ataque" à categoria dos jornalistas, e assim decidiram, por unanimidade, fazer uma paralisação de 24h na próxima terça (03/09), que pode se alongar a depender da resposta da EBC e do governo Federal. 

A greve é uma reação à decisão da empresa de atacar a jornada especial da categoria, prevista na Seção XI da CLT desde 1943, ainda com Getúlio Vargas. Ao elaborar o novo Plano de Cargos e Remunerações (PCR), a direção rebaixou os salários da carreira dos jornalistas na empresa em comparação a outros grupos de trabalhadores, criando um critério de remuneração por hora. Na prática, ao burlar a CLT, nos considera trabalhadores de jornada parcial, punindo a categoria pelo direito histórico da profissão. A luta dos jornalistas da EBC é por um PCR isonômico entre as diferentes carreiras, e, ao mesmo tempo, defendemos todos os ganhos econômicos que a proposta de PCR da empresa estabeleceu para os demais trabalhadores e trabalhadoras da EBC.

O ataque da EBC, portanto, é contra toda categoria dos jornalistas, não apenas aos que hoje trabalham na empresa. A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) já se manifestaram contra a proposta por entenderem que ela fere os direitos nacionais dos trabalhadores.  Leia aqui: https://abre.ai/kTr6

Hoje, os jornalistas recebem o mesmo salário de outros trabalhadores com nível superior, mas, com a proposta da Diretoria, eles passariam a ter uma remuneração básica 12% menor. O ataque da empresa pública de comunicação nacional contra seus jornalistas abre margem para as empresas privadas seguirem pelo mesmo caminho. Saiba mais aqui

Esperamos que o ministro Paulo Pimenta – que deve voltar à Secom nos próximos dias – corrija esse grave erro da direção da EBC. Afinal, a defesa do trabalho da imprensa, que o governo diz respeitar, se restringe à liberdade dos barões da mídia ou se estende também para a classe trabalhadora? 

A próxima terça-feira terá uma absoluta paralisação do jornalismo dos veículos públicos - Agência Brasil; TV Brasil; Rádios Nacional, da Amazônia, Alto Solimões e MEC, além da Radioagência Nacional - e também nos estatais Canal Gov, Agência Gov e a Voz do Brasil.

terça-feira, 9 de julho de 2024

Vem aí o Cine Mercosul


O Acordo de Coprodução Cinematográfica e Audiovisual do Mercosul permite o acesso a benefícios e apoio governamental Pa produção cinematográfica em múltiplos países. O termo ainda garante a colaboração equitativa nas coproduções, respeitando a identidade cultural de cada país e facilitando a divulgação internacional das obras.


Por Chico Sant'Anna

Os produtores cinematográficos dos países membros do Mercosul terão mjais facilidades de acesso a fontes de financiamento da produção audiovisual. Foi assinado no Paraguai o Acordo de Coprodução Cinematográfica e Audiovisual do Mercosul pelo qual, as produções realizadas no âmbito de qualquer um dos países membros serão consideradas igualmente de nacionalidade dos países coprodutores. Assim, poderão ter acesso a benefícios e apoio governamental em múltiplos países. O termo ainda garante a colaboração equitativa nas coproduções, respeitando a identidade cultural de cada país e facilitando a divulgação internacional das obras.

Há um ano, os países membros do Mercosu vinham negociando esse pacto. No domingo (7/7), por ocasião da Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum do Mercosul, em Assunção, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai assinaram o acordo que em breve também contemplará a Bolívia, recém entrada no bloco. Essa prática é muito comum na Europa. É de fácil percepção ver nos créditos dos filmes as múltiplas agências de fomento a cinematografia de diferentes países e mesmo de um fundo europeu.

Para a secretária do Audiovisual, Joelma Gonzaga, o acordo representa um marco significativo para a indústria cinematográfica e audiovisual. "Ele não só fortalece a cooperação entre os países do Mercosul, mas também valoriza e respeita a identidade cultural de cada nação, abrindo novas oportunidades para a criação e difusão de nossas produções internacionais.", afirma.

Coprodução

O acordo estabelece que as produções realizadas no âmbito deste receberão reconhecimento de nacionalidade dos países coprodutores, permitindo acesso a benefícios e apoio governamental. Além disso, garante colaboração equitativa nas coproduções, respeitando a identidade cultural de cada país e facilitando a divulgação internacional das obras. O acordo tem como objetivo estabelecer uma regulamentação específica a ser adotada pelos sistemas jurídicos dos países da região. Na mesma ocasião, foi proposta a criação de um Comitê Técnico Jurídico para discutir o tema, convidando os representantes legais das delegações a fazerem parte dele.

sexta-feira, 3 de maio de 2024

A “desoneração da folha” e o jornalismo em proveito próprio

 


Por Chico Sant’Anna[1]

A cobertura que a sociedade brasileira vem sendo obrigada a consumir sobre a chamada “desoneração da folha” nos leva a questionar que tipo de jornalismo está sendo ofertado. Pessoalmente, arrisco a dizer que seria um “jornalismo de interesse”, no qual os meios de comunicação buscam sensibilizar a opinião pública e, consequentemente, pressionar o parlamento e o governo a conceder o benefício de redução da contribuição previdenciária a um seleto grupo de 17 segmentos da economia nacional, dentre eles, a própria imprensa, em especial as emissoras de rádio e TV. Um jornalismo em proveito próprio.

Essa não seria a primeira vez que isso ocorre na esfera pública brasileira. Para citar um caso mais recente, o processo de privatização das empresas de telefonia e telecomunicações. Como várias das empresas jornalísticas tinham interesse econômico nessa privatização, em especial da Embratel, responsável à época por transmitir os sinais de rádio e TV, a cobertura sempre foi simpática ao processo, mesmo diante das denúncias de irregularidades que culminaram com a demissão do então ministro das Comunicações, Mendonça de Barros.

Há uns três anos, cotidianamente, a imprensa bate na mesma tecla. E apesar da insistência no tema, a abordagem editorial não é nem honesta, nem ampla o suficiente para o cidadão, o contribuinte, e muito menos, plural. Em nenhum momento, por exemplo, é dito qual a diferença dos valores a serem arrecadados por um método e pelo outro. A imprensa tão ciosa em reduzir o déficit público; que defendeu reformas previdenciárias que levaram ao arrocho dos trabalhadores, se cala sobre os efeitos dessas regras contributivas no caixa do INSS.

Contrato com o leitor

No jornalismo tradicional existiria um contrato com o leitor estipulando a responsabilidade das informações transmitidas serem autênticas. A noção de “contrat communicationnel”, desenvolvida pelo linguista francês e especialista em Análise do Discurso, Patrick Charaudeau[2], vincula implicitamente o jornalista ao leitor, determina um elo à veracidade, se não à verdade dos fatos, que não se faz presente na publicidade e na literatura. Embora o autor tenha se referido ao profissional, ao individuo, creio que a avaliação deve ser estendida ao meio de comunicação ao qual está vinculado, uma vez que trabalha sob normas editoriais, na maioria das vezes, feitas sob medida para atender ao grupo econômico que mantém a mídia, em questão.

Na mesma linha, Eugênio Bucci[3], afirma que a atividade jornalística tem como cliente o cidadão, o leitor, o telespectador. Nesse sentido, o jornalista se obriga – em virtude da qualidade do trabalho que vai oferecer – trazer a informação mais transparente e para isso, ouvir, por exemplo, lados distintos que tenham participação numa mesma história. Ouvir todos os envolvidos, buscar a verdade, fazer as perguntas mais incômodas para as suas fontes em nome da busca da verdade é um dever de todo jornalista.

Meu pirão primeiro

Reduzir os gastos com encargos sociais tem sido uma rotina das empresas midiáticas nacionais. Historicamente, muitas delas se apresentam ou se apresentaram, como inadimplentes costumaz para com o INSS. Grandes grupos, como o Jornal do Brasil, Manchete, Gazeta Mercantil, Tupi, dentre outros, ao falirem deixaram rombos impagáveis da Previdência Social – inclusive de valores que foram debitados do trabalhador - e também do FGTS. Sempre se valeram de “criatividade” para burlar essa responsabilidade patronal. Primeiro, foi a eternização dos free lancers, que ganhou a paradoxal alcunha de frelancer fixo. Ou seja, a informalidade permanente. Contrataram via empresas terceirizadas ou cooperativas de trabalho, que comiam parcela importante do salário do profissional. Por fim, investiram na transformação do trabalhador pessoa física em pessoa jurídica, em empresa, mesmo que fosse empresa de uma só pessoa.

As mudanças de legislação fomentadas pelos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro trouxeram mais segurança jurídica – termo que a mídia adora – permitindo que esse formato de contrato, até então considerado burla da legislação trabalhista, fosse reconhecido pelo STF. Dependendo das letrinhas do contrato como PJ - que deixa de ser trabalhista e passa a ser de relação comercial -, não haverá direitos tradicionais como Licença Gestante, de Saúde, 13º salário, FGTS, férias e até mesmo limites de jornadas de trabalho e pagamentos de hora extra, ou adicionais noturno, insalubridade ou periculosidade.

Nenhum desses detalhes é exposto pela mídia nacional ao contribuinte-espectador, em especial aos trabalhadores celetistas, que correm o risco de perderem no futuro mais benefícios securitários na hipótese de novo rombo na Previdência. A imprensa que é tão ciosa pelo chamado controle das contas públicas não revela em quanto isso pode impactar o equilíbrio orçamentário.

Empregos

O argumento pra defender tal benesse é o da geração de empregos e aumento de renda. Mesmo assim, não vem a público quanto novos empregos foram gerados e quanto o salário médio cresceu além da inflação nesses 17 setores, desde a concessão dessa isenção fiscal em 2012. Buscam sensibilizar informando que são os segmentos que mais empregam e ameaçam com demissões ou redução de salários se não forem atendidos. Nesse ponto, a comunicação governamental também falha. Deveria botar os detalhes em público.

Entretanto, a se pegar o setor jornalístico, segundo dados da Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, a redução dos gastos previdenciários não resultou assim em mais empregos ou melhores salários, pelo menos não na mídia. Apesar do benefício da desoneração da folha, o mercado de trabalho formal de jornalistas encolheu 21% em nove anos (2013-2021) Mesmo o espectador mais desatento perceberá que grandes nomes do telejornalismo já não mais estão na telinha. Até nas novelas e na transmissão de eventos desportivos a faces e vozes são novas, algumas até então desconhecidas. Não sei que impacto isso tem dado no Ibope.

Segundo a presidente da Fenaj, Samira de Castro[4], com base em estudo do Dieese, houve um “um visível enxugamento dos empregos com carteira assinada, sobretudo nos veículos jornalísticos tradicionais”, a chamada mainstream media. Não consegui a variação da renda média do jornalista, no mesmo período. Mas a renda média em 2021 apresentava um rendimento (salários mais adicionais e gratificações) de R$ 5.745,30, bem modestos para um segmento empresarial que tanto fatura



[1] Jornalista, pesquisador científico, PhD em Ciências da Informação e Comunicação, pela Universidade de Rennes 1 - França e Mestre em Comunicação pela Universidade de Brasília.

[2] CHARAUDEAU, Patrick. (1997). Le discours d’information médiatique – La construction du miroir social. Paris, Nathan

[3] BUCCI, Eugênio, (2006). Jornalistas & assessores de imprensa, profissões diferentes requerem códigos de ética diferente. In: Observatório da imprensa, Ano 11 – nº 397 – edição eletrônica de 5/9/2006, Disponível em http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=397JDB001

[4] In: Fenaj – News letter de 03/01/2024: Mesmo com desoneração da folha, mercado de trabalho formal de jornalistas encolhe 21% em nove anos