Em Sistemas públicos de comunicação no mundo: Experiências de doze países e o caso brasileiro, os pesquisadores Diogo Moyses, Flávia Azevedo, Jonas Valente e Sivaldo Pereira, do Intervozes-Coletivo Brasil de Comunicação Social, trazem como estão formados doze sistemas públicos de comunicação no mundo e comparam-nos com o caso brasileiro.
Na Europa e na América Latina foi o sistema de difusão pública o que estreara a radiodifusão, garantindo assim, em sua maior parte, a legitimidade a partir da condição de monopólio do setor. No caso brasileiro, segundo o livro, o que temos é a preponderância do sistema comercial e a mídia não-comercial, inclusive, não tem a possibilidade de propagação de uma mesma emissora estatal ou pública por todo o país, processo que só começa a ser alterado a partir da criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em 2007. Mesmo nos Estados Unidos, cuja comunicação comercial é mais destacada e com dimensões maiores que o nosso país, há órgãos de regulamentação da comunicação pública e comunitária.
Daí a importância de tal análise para o aprofundamento das discussões relativas à formatação de um complexo de comunicação realmente público por aqui, a partir da análise de outros modelos de difusão neste sistema. Inclusive, o livro cobre uma lacuna importante sobre o assunto, já que análises sobre o desenvolvimento da mídia pública de outros países praticamente não é retratada por autores brasileiros - com exceção de A melhor TV do mundo: O modelo britânico de televisão, onde Laurindo Leal Filho faz uma análise sobre a BBC, caso “clássico”
de modelo público de radiodifusão com qualidade no mundo mesmo após a quebra do monopólio e a aplicação do modelo capitalista neoliberal consolidado na década de 1980.
O livro aborda inicialmente as “Concepções e abordagens conceituais sobre sistema público de comunicação”, apresentando as concepções adotadas nesta obra a partir das perspectivas de como podem ser utilizadas as mídias não comerciais e de acordo com o que pensam e praticam determinados setores comunicacionais, sejam pesquisadores ou dirigentes de meios públicos.
Do segundo ao décimo-quarto capítulos, os autores se revezam na tarefa de estabelecer um raio-x dos sistemas públicos de comunicação de doze países do mundo, através de cinco pontos de análise: I. Histórico do sistema público: fundação, desenvolvimento e consolidação; II.
Estrutura do sistema; III. Modelo de gestão e formas de participação; IV. Modelo de financiamento; V. Programação; e, por fim, VI. Questões atuais em debate no país.
É através das análises sobre os sistemas de Alemanha, Austrália, Canadá, Colômbia, Espanha, Estados Unidos França, Itália, Japão, Portugal, Reino Unido, Venezuela e Brasil, perfazendo quatro continentes, que podemos verificar certas curiosidades nas diferenças entre os modelos. Um dos pontos em comum quanto ao debate consiste nos modelo de financiamento dos sistemas públicos de comunicação, onde se destaca as fontes de financiamento público, a captação externa (patrocínio, apoios culturais, publicidade,...) e a parte da receita oriunda diretamente dos governos. Inclusive, o livro mostra a preocupação na Europa, a partir do caso francês, em proibir a publicidade nas emissoras públicas devido a pressões do mercado comercial, sedento pelos recursos destinados às emissoras públicas.
Outro ponto que apresenta diferenças consiste no sistema de gestão de cada complexo e como se dá a influência dos poderes constituídos e, principalmente, da população nas emissoras. O caso da NHK, do Japão, é interesse para se observar, já que uma das condições para a entrada em seu conselho consultivo é de não participar e não ter nenhuma ligação com qualquer empreendimento comercial de radiodifusão.
Dois sistemas podem atrair o leitor devido a históricos opostos. O sistema do Reino Unido, encabeçado pelos canais da BBC, desde a década de 1930 gerido pelo Estado, com transmissões especiais para cada região que forma o reinado e com reconhecida qualidade dos programas.
Enquanto isso, na Venezuela, após a não renovação da concessão da RCTV em 2006, a constituição da Televisora Venezolana Social (TVes), que apesar de ser gerida com recursos oriundos totalmente do Poder Executivo, tenta aplicar características públicas ao sistema – além dele há a TV Unisur, que é uma tentativa a partir do governo venezuelano de estabelecer uma TV dos e para os países sulamericanos.
No capítulo final, os autores analisam o panorama dos sistemas públicos de comunicação no mundo e traçam os desafios ao caso brasileiro, que apresenta uma situação diferenciada a partir da criação da EBC e, com isso, a possibilidade de uma Rede Pública de Televisão, que deve se tornar importante para que outras emissoras públicas (estaduais e municipais) possam se integrar ao processo de digitalização do meio.
A descrição dos sistemas públicos de comunicação neste livro mostra que apesar das dificuldades vivenciadas por tais modelos por todo o mundo, especialmente quando a estrutura comercial pressiona, eles continuam como elementos importantes para a discussão pública dos temas tratados no cotidiano social, tendo, principalmente, a legitimidade da população para isso.
O Brasil ainda tem um longo caminho a desenvolver, especialmente no que consta à conquista desta credibilidade perante um público que tende a ligar TV não comercial à “TV do gestor” e, principalmente, estar acostumada à forma e ao conteúdo gerado por apenas uma emissora de televisão.
Sistemas públicos de comunicação do mundo: Experiências de doze países e o caso brasileiro é uma excelente contribuição para que possamos entender as possibilidades reais deste tipo de emissão midiática e o quanto ainda temos que caminhar em direção a um modelo bem menos selvagem e, consequentemente, mais democrático que o que possuímos.
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