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sábado, 17 de outubro de 2009

TELEJORNALISMO EM CLOSE: As notícias que leio conheço antes mesmo de ler

Por Paulo José Cunha


“Trá-lá-lá, trá-lá-lá, ê, ê!
O jornal de manhã chega cedo
Mas não traz o que eu quero saber
As notícias que leio, conheço,
Já sabia antes mesmo de ler...”

Torquato Neto em “Domingou”, de 1967, com Gilberto Gil

Outro dia, quando esteve na Faculdade de Comunicação da UnB para lançar seu livro “Jornal Nacional – Modo de fazer”, perguntei a William Bonner sobre a angústia de fechar o principal telejornal do país sabendo que raramente irá dar uma notícia exclusiva, já que os sites e blogs da internet, com sua ducha permanente aberta despejando informação nova nos computadores do planeta fez com que jornais, revistas, telejornais, radiojornais e até alguns webjornais cheguem velhos ao consumidor.
Concluir que a internet está impondo uma forma nova de fechar a primeira página ou a escalada do Jornal Nacional é muito pouco. Na verdade, o que vem ocorrendo é uma revolução em escala planetária e em ritmo eletrônico na forma de se fazer um troço chamado jornalismo, da primeira à última página. Revolução que alcança, inclusive, a linguagem que acabei de usar, uma vez que o conceito de página, diante de um mundo noticiado em real time, foi virado pelo avesso. Quando bato os olhos em alguns jornais impressos, inclusive os jornalões do eixo Rio-São Paulo, e os vejo repetindo bovinamente o que já saiu no UOL ou no Terra, não consigo conter o riso. Porque, diante do alerta de estudiosos do mundo inteiro, até hoje eles não entenderam que sua função mudou. É muito mais a de contextualizar e analisar do que informar. Os meios eletrônicos - inclusive a televisão! -, já fizeram a fineza de distribuir o que interessa na área do hard-news. Cabe aos impressos (e aos eletrônicos que pretendem resumir o dia) destrinchar a história, torná-la “compreensível”. Quem não faz isso me lembra aquele tempo, e não faz muito, em que os jornais, durante a Copa do Mundo, abriam manchetes no dia seguinte ao jogo dizendo: “Brasil vence a Argentina por 2 x 0”. “Quá! A gente já viu na TV! A gente acompanhou o jogo pelo rádio!” Pois pode ir à banca da esquina e continue a rir, porque mais de meio século depois e muitos jornais continuam a noticiar aquilo que Deus, o Diabo e o mundo já sabiam há muito tempo.

Bonner respondeu à minha pergunta concordando com a angústia. Disse que nesses casos as equipes se esforçam para fazer novas abordagens, ouvir outros personagens. E, sem explicar a razão, garantiu que a audiência do JN cresce quando morre uma pessoa famosa, mesmo que o assunto fique repicando na internet, no rádio e na própria televisão o dia inteiro. Não tive direito a réplica, até porque a prioridade, durante a palestra, era dos alunos. Se tivesse, diria suspeitar que essa elevação de audiência se deve ao grande número de pessoas ainda sem acesso à internet; à necessidade do público à “informação organizada”, capaz de fazê-lo entender a dimensão da notícia; à expectativa de que o JN antecipe as conseqüências e contextualize o fato; e à esperança do público de que o telejornal explore um ou outro ângulo que tenha escapado aos blogs e sites de notícias.
Informação organizada, ângulos inusitados, contextualização e antecipação de consequências. Talvez aí esteja a saída para o imbroglio em que se meteu a imprensa, digamos, tradicional, com a avalanche da internet. Quem tiver juízo vai prestar atenção nesses três aspectos. Quem não tiver, lamento muito, mas vai terminar fechando o boteco. Inclusive o JN.
“As notícias que leio, conheço/ Já sabia antes mesmo de ler”, anunciou premonitoriamente o poeta mais de 40 anos atrás, quando nem se imaginava que um dia existiria uma coisa chamada internet. É bom prestar atenção no que ele escreveu. Naquela época o JN se preparava para usar fraldas...


As opiniões aqui postadas são de responsabilidade de seus autores

Um comentário:

sandra disse...

De fato, é surpreendente a rapidez imposta pela internet. Os impressos deveriam apresentar óticas diferenciadas, boa apuração e serem mais analíticos. Entretanto, o que se vê é uma ode à obviedade.