Caros leitores e leitoras.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

CARNE E OSSO é o documentário sobre abatedouros da TV Comunitária do DF

Por César Fonseca

TEMPO RECORDE QUE ESTRAGA A SAÚDE E DESEQUILIBRA O SER HUMANO. 
 
A mecanização da morte dos frangos não dispensa os braços humanos para a realização dos cortes perfeitos, artísticos, decorrentes de repetição anti-criativa, esquizofrênica, das retiradas das vísceras, em tempos absolutamente cronometrados sob olhares vigilantes de inúmeros fiscais, mais parecidos com capitães do mato do tempo da escravidão, que, sequer, dão às trabalhadoras chances de trocarem informações enquanto executam suas tarefas repetitivas, cansativas, ao mesmo tempo em que são proibidas de expedir tempo superior a três minutos para fazer suas necessidades fisiológicas em casos extremos. 
O trabalho anti-criativo, meramente, mecânico, rigorosamente, é fonte de intensa depressão, agravada por salários miseráveis em longas jornadas de trabalho, enquanto os empresários cuidam de descartar as possibiliddes dessa doença, que, dizem, são próprias dos desocupados. Mas, o número excessivo de acidentes, por conta desse cotidiano desumanizado comprova a barbárie a serviço da produtividade, permanente fonte de infelicidade dos trabalhadores do setor, aos quais pouca atenção tem sido dada por parte das autoridades governamentais, dos políticos, dos estudiosos, conforme expõe o excelente documentário CARNE E OSSO – O trabalho nos frigoríficos”, verdadeiro inferno gelado

Uma coisa terrível esse documentário de angustiantes 90 minutos que está passando na TV Cidade Livre, o canal comunitário mais consciente, politicamente, do Brasil, que joga no colo dos brasilienses a problemática social brasileira, verdadeiro caso de atentado aos direitos humanos, carência nacional que a presidenta Dilma Rousseff acabou de constatar em sua viagem a Cuba.

Cada brasileiro, cada brasileira, que, todos os dias, em suas casas, alimentam-se de carne – ou seja, nem todos os brasileiros, nem todas as brasileiras, podem ter esse luxo, é verdade, dada a desigualdade social, ainda, infelizmente, existente no país – deveriam ver com grande interesse esse filme, esticamente, revolucionário a despertar a repugnância de um status quo anti-social.

Não, claro, para repudiá-lo, mas, especialmente, para a amá-lo; há tempos não via algo tão brutal, mas, também, tão humano, tão tocante, tão emocionante.

A brutalidade traz intrínseca uma moralidade estética bárbara, cuja essência é determinada pelas razões que, obviamente, a fazem existir.

Estamos falando dos trabalhadores dos frigoríficos, bovino, suino, avino, as três principais fontes de proteínas consumidas pela maioria da população brasileira.

Você aí, que compra o seu franguinho, a sua picanha, a chã de dentro, a alcatra, para assar, aos domingos, com a família, tomando aquela cervejinha gelada, deixando o espírito se soltar do corpo, cansado do trabalho semanal, quase sempre mal remunerado, carregado de lamentações etc e tal, não deveria perder esse incrivel trabalho realizado pelos diretores Caio Cavenatti e Carlos Juliano, em “CARNE E OSSO – Trabalho no frigorífico”.

Se liga na TV Cidade Livre – Canal Comunitário de Brasília, puxe lá, e curta.

Já, se você, por exemplo, é um fiscal do Ministério do Trabalho, que está aí, em sua mesa, cuidando daquela tarefa burocrática, de selecionar papéis, casos escabrosos, do dia a dia, da labuta dos trabalhadores desse setor da economia, que emprega, hoje, cerca de 800 mil trabalhadores, não pode deixar passar.

Sabia que 20% dessa mão de obra – 160 mil seres humanos – se encontram, sob escravidão, doente, fisíca e mentalmente deprimidos, devido ao excesso de carga de trabalho, de exigências absurdas, que colocam as pessoas, encerradas em grandes salas, a uma temperatura média de 8 graus centígrados, diante de escassa segurança, perante instrumentos cortantes, perigosíssimos etc?

Enfim, mexa-se caro fiscal burocrata, saia da sua cadeira e vá fazer uma grande pesquisa, de modo a contribuir, o mais rapidamente, possível para modificar as precaríssimas condições de sobrevivência laboral predominantes nessa indústria, que se transformou no grande motivador das exportações brasileiras, do agronegócio, movimentando bilhões de reais, agitando o plantio do milho, a fabricação do farelo, a produção de cama de frango, utilizada na lavoura como fertilizante, ainda, não devidamente compostado, para eliminar os patógenos e as doenças que se deslocam para o lençol freático, poluindo, rios, lagos e lagoas etc, comprometendo a vida animal, em meio à devastação ambiental crescente.

Desprezo ao ser humano

SOBRECARGA DE TRABALHO SEM REMUNERAÇÃO. ROUBO DE SALÁRIO. As dores na coluna vertebral são as mais comuns deformações impostas pelo trabalho escravo imposto aos trabalhadores nos frigoríficos brasileiros, de acordo com as estatísticas dos ministérios da Saude e do Trabalho, compulsadoas pelo documento CARNE E OSSO, um retrato vergonhoso da indústria nacional, que ao lado do lucro que alfere, não cuida daqueles que geralmente produzem o valor responsável pela multiplicação dos empresários, ou seja, o trabalhador, mal rermunerado e pessimamente respeitado pelos donos do capital. 

Essa pesquisa, que tem de ser minuciosa, escandalosa, impactante, precisa movimentar as consciências no Congresso Nacional, de modo a debater e votar uma legislação essencialmente humana para os trabalhadores dos frigoríficos, que pegam no batente às 5 da matina até às 4 da tarte, para ganhar um salário mínimo miseravel de R$ 670, em que as horas extras são surrupiadas, como se rouba um doce de uma criança indefesa, deixando-a sem ação, apenas se dispondo do choro para o protesto inútil.

Uma legislação moderna para os trabalhadores e trabalhadoras dos frigoríficos, necessariamente, tem de reduzir o tempo de trabalho semanal e, especialmente, cuidar, urgentemente, da qualidade desse trabalho, pois os que ali se esfolam sob temperatura dos pólos ártico e antártico, são obrigados a se submeterem a uma ditadura laboral espartanta, violenta, tudo em nome da santa produtividade.

E as enfermidades, as doenças, caracterizadas, sempre, pelo esforço repetitivo?

Sabia, cara leitora, que são necessários 18 movimentos ultra-rápidos para desossar um peito e uma coxa de frango em apenas 60 segundos, repetitivamente, de modo a encher uma caixa de 20 quilos em menos de 20 minutos, numa rapidez sideral, ultrapassando a razoabilidade mecânica exigida para os músculos humanos?

Sabe, meu caro, quantos movimentos, por minuto, a ciência admite, para o trabalho mecânico, humano, sem que haja prejuízo para a saúde, em um minuto? 35; os trabalhadores e trabalhadoras dos frigoríficos alcançam 4 vezes mais.

Barbárie total.

Os cortes nos músculos dos bichos se repetem nos músculos humanos; os estresses nervosos se multiplicam, e as juntas dos ossos se atrofiam, perdendo a agilidade, que leva à distração, necessáriamente, cujo resultado são desastres horríveis, mãos e braços decepados, personagens cortados em seu corpo e em sua alma, sem falar nos permanentes tiques nervosos, na instabilidade emocional etc e tal.

Veja o filme e se alarme.

Quatro anos sem aumento de salários, horas extras roubadas, eis os depoimentos comuns.

Os bairros onde moram os e as trabalhadoras nos frigoríficos, onde eles existem, no Rio Grande do Sul, no Mato Grosso do Sul, no Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Goiás, Distrito Federal etc são verdadeiras favelas, cercadas de matos, bichos, esgotos a céu aberto, sem água encanada, fossas que supitam etc.

O documentário é tragicamente belo, ao pegar as expressividades, os silêncios, as lágrimas, um cotidiano miserável, insalubridade sem fim por todos os lados.

As mulheres, desesperadas, não conseguem se desligar dessa escravidão, porque seus filhos dependem da renda que elas auferem.

Dormem pouco, levantam sobressaltadas, vivem nervosamente tensas; o prazer de viver inexiste, pois vivem para o desprazer em nome do progresso.

Cinicamente, os departamentos médicos, que cuidam dos casos de doenças, descartam, sempre, a existência das depressões,que o acúmulo de exploração laboral, tristeza espiritual e falta total de perspectivas de se viver feliz produzem na alma humana , obrigada a viver abjetamente.

Condições de trabalho desprezíveis

INSALUBRIDADE INTENSA EM TROCA DE DESGASTE HUMANO. 
 
Os grandes frigoríficos brasileiros que, atualmente, ganham o mercado internacional, conquistando as honras para a indústria de carne brasileira no mundo, deveriam cuidar mais da saúde dos seus trabalhadores, e não submete-los às condições deploráveis de vida, conforme demonstra o documentário exibido pela TV CIDADE LIVRE, um tiro na consciência de todos os consumidores de proteínas animais, que deveriam ser despertados para exigir mais visão social da empresa, assim como o governo, para abrir a elas os cofres generosos do BNDES, deveria impor contrapartidas em forma de oferta de trabalho digno nas fabricas, onde, infelizmente, predomina a visão da barbárie. 

O trabalho de Caio Cavenatti e Carlos Juliano, precedido de ampla pesquisa, farta fotografia, mergulha em um cotidiano que está presente nos livros de Dickens, quando o capitalismo inglês vivia o tempo da barbárie total, no século 19, explorando as crianças, em jornadas de até 15 horas diárias.

A barbárie, também, está, vivamente, presente na cena brasileira contemporânea, no compasso da industrialização, descuidada dos interesses humanos, mas, tão somente, voltada para a avidez lucrativa.

Evidentemente, no século 21, no tempo da internet, da instantaneidade das comunicações, dos avanços científicos e tecnológicos, colocados a serviço da produção e da produtividade máximas, em nome do santo lucro, o santo graal capitalista, não se justifcam mais extensas jornadas de trabalho.

Com quatro horas de trabalho, apenas, o trabalhador paga o seu salário. O resto é salário não pago, simplesmente, roubado, descaradamente.

Faz-se necessário, que, nesses serviços, altamente, estressantes, sejam adotadas jornadas mais curtas de trabalho, para que, primeiro, seja preservada a dignidade humana; segundo, que seja aumentada a oferta de trabalho e terceiro, que se dê fim ao roubo da mais valia, trabalho roubado, que eleva a taxa de lucro empresarial, afetada, quase sempre, pela concorrência, que vai produzindo, no setor – e em todos os demais – uma caminhada inexorável para a oligopolização.

Está explicado: o grande lucro, a grande riqueza e o grande poder empresarial dos frigoríficos brasileiros, como, por exemplo, o de um Friboi, se deve ao grande roubo do trabalho não pago pelo excesso de horas trabalhadas a custo baixo, mediante reposição acelerada de mão de obra, pois, afinal, aquela que se vai sucumbindo, ao longo das jornadas extensas, cansadas, adoentadas, desfibradas, tem que ser reposta imediatamente.

O ser humano vira uma laranja que se chupa até o último caldo pelo capitalista, que, em seguida, joga fora o bagaço e busca, avidamente, outra no cesto, para continuar saciando sua sede insaciável de lucro.

O documentário em exibição deve ser assistido pela presidenta Dilma Rousseff que está presssionando o Congresso para acelerar o fim das vantagens conferidas aos trabalhadores pela Previdência, em nome do combate ao deficit público, quando se sabe que a fonte de gastos por conta da cobertura das doenças, pelo excesso de trabalho, é maior do que os gastos com os benefícios, propriamente, ditos, conforme explicam os médicos que dão seus depoimentos sobre a barbárie trabalhista nos frigoríficos.

Ou seja, eventuais mudanças na Previdência massacrarão ainda mais os trabalhadores.

E, no Congresso, onde, parece, não há nada para fazer, segundo  o Deputado Romário(PSB-RJ), suas excelências deveriam promover uma exibição desse trabalho, realmente, brilhante, que atinge a consciência humana, como uma facada no coração, estetizando em grandes traços um perfil brasileiro que o futuro deplorará, vergonhosamente.

3 comentários:

Anônimo disse...

Pô, os animais não-humanos estão sendo esfolados, mortos, estripados, e os coitadinhos são os animais humanos que fazem isto para ganhar dinheiro?!? Tenham dó! Eu não como carne por compaixão ao Outro, ao "diferente", ao "diverso", e não por compaixão a Mim (via meu "similar", meu "igual").

Anônimo disse...

O interessante desta análise é que ela mostra um pouco do que ouvimos de nossos avós sobre o consumo de carne ou a mistura, que aumentou muito nestes ultimos 50 anos. Vale a pena refletir e reduzir a quantidade de "mistura" que consumimos no dia a dia.

Anônimo disse...

O descaso com esse trabalhadores é obvio, não são maquinas, que vc aperta um botão ligar ou desligar, se fazem esse trabalho pois não a ofertas de outros. São submetidos a isso pois precisam sustentar suas famílias. Independente de quem come carne ou não é uma questão social de interesse publico. Imagina trabalhar horas e horas e ainda mais sendo oprimidos, devido a pressão psicológica que sofrem.