Por Bepe Damasco, publicado anteriormente em Pátria Latina.
No último post, prometi voltar a um assunto que certamente tira o sono de todos os militantes da nobre causa da democratização dos meios de comunicação do Brasil. Manifestei naquele artigo minha estranheza com o descompasso entre a coragem revelada pela presidenta Dilma para enfrentar Tio Sam na questão da bisbilhotagem e a inação diante de uma grave ameaça à democracia brasileira: a concentração absurda de todas as plataformas de mídia nas mãos de nove famílias. Até o insuspeito escritor peruano Mário Vargas Llosa, conhecido por suas posições de direita, disse na semana passada que qualquer regime que mereça ser chamado de democrático não pode conviver com tamanha concentração midiática.
Não. Não pretendo aqui repetir os argumentos exaustivamente expostos neste espaço acerca da necessidade de um novo marco regulatório para a radiodifusão brasileira como condição fundamental para a consolidação da nossa trôpega democracia. Prefiro enveredar aqui por outra linha de raciocínio.
Vamos, então, admitir que a presidenta Dilma tenha feito as contas e concluído ser impossível aprovar uma Ley de Medios num Congresso Nacional muito permeável às pressões e ameaças do PIG. Levemos também em conta que Dilma, pautada pelas pesquisas qualitativas, as tais qualis, que lhes são apresentadas pelo marqueteiro João Santana dia sim, outro também, não enxergue ambiente favorável na conjuntura para encampar esta batalha.
Vá lá ainda que para a cúpula do governo o que vale é ganhar eleição. Para isso, como nos últimos três pleitos presidenciais, bastam os 45 dias de propaganda gratuita no rádio e na TV, quando finalmente o governo do PT consegue mostrar suas realizações em horário nobre, quebrando o monopólio partidarizado do PIG.
Mesmo discordando dessa abordagem pragmática ao extremo por vê-la com um tiro no pé, digamos que a presidenta e os responsáveis pela comunicação do Planalto estejam certos e todo o movimento pela democratização da mídia peque pelo voluntarismo e por um entendimento precário da correlação de forças na esfera política e na sociedade brasileira.
Mesmo assim, por que diabos nem ações comezinhas, de fácil execução, e que não dependem de nenhuma alteração na legislação, são implementadas pelo governo? Custava o Blog do Planalto, por exemplo, desmentir com números e análises o terrorismo econômico cotidiano dos jornalões, das revistas e da Globo ? A não ser por falta de vontade política, como entender que a presidenta e seus principais ministros não sejam assertivos e contundentes, inclusive dando nome aos bois, nas críticas às manipulações diárias do noticiário do PIG ?
Como há muito abandonou os princípios mais elementares do jornalismo, a mídia tucana dá mole, como dizem os jovens, mas o governo deixa passar batido. O gráfico escandaloso sobre a evolução da inflação que a Globonews levou ao ar foi uma oportunidade de ouro desperdiçada. Pela aritmética burra e partidarizada da emissora dos Marinho, 5,91 é maior que 6,5. Ou seja, bola quicando debaixo de uma baliza sem goleiro e o governo tira o time de campo e se omite.
O que tem a ver o medo do governo de regular a mídia - caminho seguido aliás pela quase totalidade dos países democráticos do mundo- com a inaceitável política de distribuição de sua milionária verba publicitária ? Enquanto não cria topete para fazer o Cristina Kirchner fez, por que continuar premiando o massacre diário que sofre com uma montanha de dinheiro? Por que não usar parte considerável da dinheirama que irriga os cofres da Globo, Veja, Estadão e Folha para incentivar as emissoras regionais de rádio e TV, a imprensa popular e progressista?
Até quando o governo vai continuar pagando para apanhar ? Se depender da ministra da Secretaria de Comunicações, Helena Chagas, la dolce vita dos Marinho, Frias, Mesquita e Civita está longe de acabar. Ela não se cansa de dizer que os parâmetros pelos quais os governo se guia para distribuir suas verbas publicitárias são exclusivamente técnicos. Mais audiência, mais dinheiro; mais leitores, mais dinheiro.
É inaceitável que o governo de um partido do campo popular, democrático e de esquerda adote esse tipo de política. Ainda mais quando não tem no horizonte, como é o caso, nenhum projeto que leve à desconcentração dessas verbas, com o consequente fortalecimento de uma imprensa não monopolista e que expresse o conjunto das visões de uma sociedade complexa como a nossa.
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