Por Bruno Marinoni, publicado no Observatório do Direito à Comunicação
“Os conglomerados sentem que a liberdade de imprensa é a única liberdade de expressão que existe e entendem imprensa apenas como meios comerciais”, afirmou o relator especial para promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e expressão da Organização das Nações Unidas, Frank de la Rue, em visita a São Paulo no último dia 13. Segundo ele, as grandes empresas desprezam a existência do direito de se expressar pela arte, religião e outras formas de manifestação, assim como desconsideram outras maneiras de se exercer o jornalismo, como por meios comunitários, blogs etc.
Trazido ao Brasil pela campanha “Para expressar a liberdade”, o representante da ONU defendeu durante conversa realizada com a sociedade civil, no Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, que a liberdade de imprensa deve ser compreendida como parte do direito à liberdade de expressão e “o jornalismo se define pela sua função”, pelo papel que desempenha, e não por seu caráter profissional.
La Rue defendeu publicamente a Lei de Meios da Argentina, pois não vê nela a intervenção de um governo na liberdade de opinião pública, e sim uma iniciativa no sentido de equilibrar o setor ampliando a diversidade e participação. “Na América Latina tem se visto os meios de comunicação unicamente pela ótica comercial, o que é um erro”, declarou. Para a efetivação do direito à liberdade de expressão, o relator defende que os princípios mais importantes são a “diversidade de meios” e a “pluralidade de ideias”.
O representante da ONU, que vive na Guatemala, relatou também ter recebido muitos depoimentos de jornalistas na América Latina que têm sido “acossados” pela justiça, resultando em constrangimento por meios de sanções que impedem o livre exercício de suas atividades. Ficam assim comprometidas as iniciativas de produzir informações e tecer análises críticas, fundamentais à liberdade de expressão, de forma independente. O relator da ONU defende que a difamação não seja mais tratada de forma penal, mas sim civil, garantindo assim condições para que se exerça a crítica necessária para a democracia, principalmente quando esta se dirige ao exercício de funções públicas.
Segundo Frank de La Rue a redação do artigo 20 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP), em que consta que “todo o apelo ao ódio nacional, racial e religioso que constitua uma incitação à discriminação, à hostilidade ou à violência deve ser interditado pela lei” deveria ser estendida aos temas do gênero, infância e orientação sexual. Assim, ainda que não defenda uma regulação dos conteúdos por parte do Estado, o relator disse que considera importante criar mecanismos na sociedade para se precaver do discurso do ódio. “O ódio não é só um sentimento, mas um sentimento que produz ação”, afirmou.
Considerando que o direito à liberdade de expressão deve ser compreendido como universal, interdependente e inter-relacionado com os demais direitos humanos, La Rue falou, durante um debate na Câmara Municipal de São Paulo na noite de quinta, que se surpreendeu com a possibilidade do Supremo Tribunal Federal de suspender a classificação indicativa. O relator da ONU disse que compreende a proteção da infância como prioridade no cumprimento de funções do Estado e que “a própria liberdade de expressão pode estar ameaçada se ela se exerce contrariando outros direitos”. Nesse sentido, uma política de classificação indicativa, a classificação dos horários de transmissão de determinados conteúdos, “é normal”.
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