Por Dimitri
Dimoulis e Soraya Lunardi
Podem ser demitidos jornalistas quando seus comentários desagradam o governo? A
pergunta faz pensar em regimes autoritários. Mas isso ocorreu no dia 29 na
Grécia, país-membro da União Europeia, organização que sempre se apresentou como
baluarte da democracia pluralista.
Todos acompanham as dolorosas etapas da crise econômica, sendo a Grécia o país
mais atingido. O que menos se comenta são as devastadoras conseqüências dos
problemas econômicos para a vida social e política. A palavra grega “democracia”
indica (e reivindica) o autogoverno do povo. Mais de 80% dos cidadãos gregos
discorda das medidas impostas pelos credores, como demissões, aumento dos
impostos, privatizações, desmantelamento dos serviços públicos, cortes nos
salários e nas aposentadorias. E o que fazem os representantes dos cidadãos?
Votam sucessivas leis para implantar essas medidas. A palavra democracia perde
seu sentido.
Enquanto grupos neonazistas aterrorizam trabalhadores estrangeiros na Grécia, e
se fala em tortura de manifestantes pela polícia, o governo se blinda contra a
imprensa que critica a política econômica e a repressão policial. Recentemente,
o jornalista Kostas Vaxevanis divulgou nomes de gregos que mantêm contas
sigilosas na Suíça. A lista circulava entre governo e promotoria, mas nunca
tinha sido publicada. Quando os nomes se tornaram públicos, a polícia prendeu o
jornalista por violação de dados pessoais, ao invés de se preocupar com os
sonegadores o os governantes que ocultaram a lista.
Voltemos à pergunta inicial. Os jornalistas que apresentam o noticiário matutino
de maior audiência, Marilena Katsimi e Kostas Arvanitis, foram demitidos porque
criticaram o ministro da Justiça grego por ter feito declarações despropositadas
num caso de alegada tortura de manifestantes presos pela polícia grega. O
diretor da televisão estatal chegou a declarar que é proibido aos jornalistas
opinar sobre casos pendentes na justiça.
Isso coloca abertamente a pergunta: pode o governo dispor de poderes ilimitados
em nome da recuperação econômica? O preço da violação de direitos fundamentais e
a ameaça à democracia é um preço caro a se pagar pela melhoria dos indicadores
econômicos.
Dimitri
Dimoulis
Nasceu
na Grécia, é professor de direito constitucional da Direito GV
Soraya
Lunardi
Professora de
direito público da Unesp
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