O desenho "A Surpreendente Excursão de Zamba" mescla aventura com história para falar de episódios como a Guerra das Malvinas
Em uma viagem pelo tempo até a ditadura, a principal missão é resgatar o amigo das mãos militares e fazer a democracia voltar ao país com a ajuda das “urnas mágicas”. A ficção dá o tom fantasioso à aventura vivida pelo personagem Zamba, mas o roteiro do desenho animado La Asombrosa Excursión de Zamba (A Surpreendente Excursão de Zamba) tem um contexto amargo do passado argentino: o regime militar que vigorou entre 1976 e 1983.
Voltado
para crianças de 6 a 12 anos, a série de animações é uma aposta do canal
estatal argentino Paka Paka para ambientá-las a temas geralmente relegados aos
livros de história nas salas de aula. Além do capítulo sobre a ditadura, entram
no repertório episódios emblemáticos como a Guerra
das Malvinas, no qual um soldado argentino explica ao pequeno Zamba que “há
países que se sentem os reis do mundo” ao se referir à Grã Bretanha.
“Zamba convida
as crianças a fazerem perguntas e refletirem sobre o que veem”, explica Cielo
Salviolo, ex-diretora e atual consultora do canal Paka Paka. “São temas mais
complexos, que não são contestados muito nas escolas, mas que quisemos contar
em um formato mais atrativo e inovador para as crianças”, explica ela sobre a
estética de videogame presente na animação - que até agora possui 14 capítulos.
No episódio
sobre a ditadura, o menino José, cujo apelido é Zamba, tem contato com o
regime militar durante uma excursão à Casa Rosada. Ainda dentro da sede de
governo, seu amigo desaparece e, ao dizer que precisará voltar no tempo para
resgatá-lo, o busto que remete ao classicismo e representa a “República”
explica que a ditadura começou em 1976 com os militares tomando o poder e
“disseminou o terror por todo o País”. Zamba precisará voltar à “época mais
escura” da história argentina para ajudar seu amiguinho, mas sem a “República”
por lá para defendê-lo. Depois do contato com os militares – que falam ao
telefone com os EUA para garantir que o “plano de ditadura em toda a América
Latina será um êxito” – Zamba é detido, mas consegue sair vitorioso
com com a ajuda das urnas eleitorais, símbolo das eleições diretas. No
final do episódio, Zamba, seus amigos e até mesmo as “Mães de Maio” celebram o
fim do período repressor.
Regionalismo.
Além de
resgatar passagens da história argentina, o desenhos traz características
comuns a qualquer criança – como o sonho de ser astronauta – e uma série de
elementos regionais. No início de cada capítulo, o protagonista explica que
vive na cidade de Clorinda, na província de Formosa, e que sua comida preferida
é o chipá, cuja massa é semelhante ao nosso pão de queijo. Ele tem como
animal de estimação uma capivara, e na escola interage com outras crianças e com
a professora, que veste o clássico avental branco.
O
projeto, explica Cielo, surgiu pela necessidade do Ministério da Educação em
fazer um desenho pensado para meninos e meninas argentinas. “Temos um problema
comum a todos os países da América Latina. Tínhamos nos canais daqui produções
feitas nos EUA para México, Brasil, Argentina. O ministério resolveu apostar em
uma produção nacional como política de educação e cultura para as nossas
crianças”, conta. O canal funciona desde 2010. Para alcançar a verossimilhança
com o universo argentino, a produção conta com a supervisão de
historiadores e educadores.
Desde
que começou a produzir e distribuir as animações nas escolas públicas do país,
o canal estatal se viu envolto em polêmicas e críticas. Historiadores e
sociólogos acharam precoce tratar determinados temas entre os pequenos. Alguns
condenaram a “versão oficial” contida na animação, feita pela produtora Perro
en la Luna e dirigida por Sebastián Mignona.
Os
produtores rebatem as críticas. “Na verdade, mostramos que é possível contar
uma história de maneira divertida e reflexiva. E isso sempre gerará polêmica”,
avalia Cielo. “Mas o importante é não subestimarmos as crianças e lembrarmos
que elas também são capazes de compreender os processos históricos.”
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