Por César Fonseca, publicado originalmente no Independência Sul-americana.
Se o PT, se o ex-governo Lula e se o governo Dilma tivessem seguido a orientação de Getúlio Vargas no campo da comunicação…
Teriam em mãos instrumento de divulgação para o debate ideológico com
os concorrentes, adversários do nacionalismo desenvolvimentista, favoráveis ao
escancaramento da economia ao capital externo e às consequentes remessas de
riqueza sem nenhum controle, como se isso fosse norma geral da economia, ao
largo da participação do Estado no processo econômico, sabendo que este
depende, essencialmente, da orientação estatal.
A luta política é, como disse Glauber Rocha, a luta ideológica.
A esquerda petista não entendeu que tem que entrar vigorosamente na
Idade de Pompeia, jogando para valer contra seus adversários.
Lula, aos blogueiros, lamentou o leite derramado.
O que fez Getúlio?
Criou a rádio nacional, a agência nacional e financiou o jornal Última
hora, que se transformou no canal por meio do qual o pensamento crítico emergiu
para combater o pensamento ortodoxo, importado, pela grande mídia capitalista,
dos Estados Unidos, para propagar a desnacionalização econômica.
Getúlio não apostou todas as suas fichas na televisão, porque, no tempo
dele, o rádio é que era o poder real da comunicação, dada, ainda, a
insuficiência tecnológica para alavancar a tevê, naquele instante ofuscada pelo
cinema.
Embora tenha sido combatido por Assis Chateaubriant, que, nos anos 50,
lançara a TV Tupi, Getúlio, estrategicamente, deixou de lado a implantação da
televisão, porque se sentia satisfeito, na sua comunicação com as massas, com o
rádio, já que comprar uma tevê era coisa para rico.
No plano das ideias, Vargas percebeu a importância do jornal.
Por isso, colocou o dinheiro do Banco do Brasil para financiar
empresário disposto a investir no nacionalismo econômico.
Um grande banqueiro, Walter Moreira Salles, criador do Unibanco,
transformou-se em um dos principais acionistas do jornal, dirigido por Samuel
Wainer.
A nata da intelectualidade escrevia e colaborava com o Última hora.
Desse modo, Getúlio criou um antídoto contra a grande mídia
oligopolizada nos moldes em que hoje atuam no Brasil cerca de apenas seis
famílias, no setor de jornalismo, totalmente, dependente dos grandes bancos,
como seus principais anunciantes.
Como as atividades bancárias, no processo de financeirização econômica
global neoliberal, passaram a multiplicar seu capital na pura agiotagem, a
ideologia capitalista virou ideologia do agiota, enquanto o povo se transformou
em escravo do capital bancário, da agiotagem.
Onde os intelectuais independentes, com visão crítica, vão escrever
seus pontos de vista diante do avanço da especulação financeira que não tem
limites?
No Globo? No Estadão? Na Folha? No Valor Econômico?
Há, há, há.
O Valor Econômico, a bíblia dos banqueiros, é propriedade do
Globo e da Folha, de modo que está tudo em casa.
Já o Estadão velho de guerra sempre, como O Globo e a Folha, alinha-se,
completamente, com os agiotas, estando, segundo comentam as más línguas, ruim
das pernas, financeiramente, dependendo, para sobreviver, do capital bancário.
O PT, Lula e Dilma ficaram com medo de estimular um novo Última Hora ou
coisa parecida, levantando o argumento ingênuo de que haveria neutralidade da
grande mídia nos embates ideológicos relativamente ao modo de governar petista.
Temeram, também, ser criticados por estarem atuando como poder
midiático, puxando a sardinha para si mesmos etc.
Ora, de que vivem os meios de comunicação atuais, alinhados com o
pensamento da direita neoliberal, senão com uma larga margem de capital
estatal, empréstimos de bancos públicos etc. e tal?
Por que financiar, apenas, a direita e não a esquerda, também?
Não estaria o próprio governo promovendo o exercício da liberdade de
imprensa, ao promover as duas opiniões contrárias entre si, para delas obter o
justo ensinamento, que a própria lei do jornalismo determina na Academia,
a de que se tem de ouvir os dois lados da notícia, visto que a realidade é dual
– positivo-negativo; singular-plural; claro-escuro; cara-coroa, yin-yang,
interagindo-se, dialeticamente, etc?
Mas, não, o governo do PT continuou seguindo a mesma orientação dos
governos neorepublicanos de Sarney, Collor e FHC, de negar ao pensamento
crítico do neoliberalismo as verbas públicas.
Repetiram, dessa forma, o tempo da ditadura.
Ora, foram ou não foram tais verbas do tesouro, do povo, as que se
destinaram, sofregamente, aos detentores do pensamento neoliberal, que, hoje,
sufoca os petistas em geral e seus aliados na crítica ao neoliberalismo?
O neoliberalismo, como a crise mundial demonstrou, está falido, mas a
opinião pública, por falta de um jornal popular e de uma tevê idem, não sabe de
nada, porque nela não chega o ponto de vista oposto ao ponto de vista
neoliberal.
Ouve-se, apenas, o samba de uma nota só, a nota da direita ideológica.
A estrutura de comunicação de massas no Brasil está totalmente nas mãos
da direita ideológica, anti-nacionalista.
Dão as cartas os políticos conservadores, que receberam, de mão
beijada, concessões generosas, para se alinharem ao pensamento neoliberal,
dominante no Congresso, financiado pelos banqueiros.
Por essa razão, até agora, os governos Lula e Dilma não tiveram a
defesa do Programa Bolsa Família como um projeto de desenvolvimento social
nacionalista, mas como um artifício assistencialista, distribuidor de esmola
para os mais pobres, a fim de que sejam estes utilizados como massa de manobra pelos
petistas no Governo, a exemplo do que faziam os velhos coronéis da política.
O fato é que a burguesia comercial, industrial e agrária
brasileira só não se sucumbiu, ainda, ao capital externo, mediante políticas
neoliberais, porque Lula e Dilma sustentam programas sociais distributivos de
renda, que se transformaram, na crise capitalista global, em bombeadores do
consumo, fortalecendo o mercado interno.
A renda disponível expressa no cartão de crédito do Bolsa Família, que
beneficia 12 milhões de famílias, 70 milhões de consumidores, correspondentes a
70 milhões de quilos de alimentos por dia, fomentou, em diversas etapas da
circulação de mercadorias, a agricultura, o comércio, a indústria, bombeando
emprego, renda, consumo, arrecadação e investimentos.
Por que os candidatos à presidência da oposição, senador Aécio Neves,
do PSDB, e ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do PSB, elegeram o
Programa Bolsa Família como plataformas dos seus discursos de lançamento de
suas campanhas, para tentar vencer a presidenta Dilma Rousseff, heim?
Mas, os petistas passaram batidos, sentindo-se envergonhados de
lançarem um jornal de âmbito nacional para defender seu principal produto
político!
Por que, incompetentes?
No momento, a grande mídia neoliberal vai conseguindo, sem enfrentar
controvérsia, desestabilizar o governo na questão da compra, pela Petrobras, da
refinaria belga de Pasadena.
Primeiro, a mídia conservadora anti-nacionalista alardeou os números
falsos levantados pela oposição, sem que tivesse alguém para contestá-la.
Não se fez jornalismo, mas política, até que a presidenta da Petrobras,
Graça Foster, anunciasse os números da empresa, que jogavam no chão os
argumentos oposicionistas.
Agora, ela faz guerra de divisão nas hostes governistas, jogando
personagens uns contra os outros, engrossando o caldo do golpe midiático contra
a candidatura Dilma.
Mas, a grande mídia não deu para esse desmascaramento dos números o
mesmo espaço que deu para alardear os números falsos.
A grande mídia nega o próprio jornalismo, ao não fornecer espaço
semelhante para as duas versões do fato.
Quando se sabe que o grande magnata da mídia nacional, Roberto Marinho,
conspirou contra a democracia, tentando eternizar generais no poder, para
agradar os Estados Unidos, como comprovaram os telegramas de Lincoln Gordon, em
1964, ao Departamento de Estado americano, tudo, então, pode acontecer,
especialmente, se o jornal dele não tem quem o contradiga.
Por isso, minha gente, não é novidade que a presidenta Dilma esteja
perdendo de goleada a batalha da comunicação, enquanto vacila em encaminhar ao
Congresso a Lei de Meios para democratizar o poder midiático no País.
Por isso, a ideologia neoliberal está ganhando de goleada, porque
seus propagandistas, na grande mídia, não encontram o contrapolo para
questioná-los.
Por isso, o Estado é visto como estorvo e não como necessário regulador
da ganância num país onde vigora a mais alta taxa de juro do mundo, e por aí
vai.
O modelo é o mesmo. O governo tem investido bilhões em publicidade nesses segmentos. Queremos é outro modelo de democracia.
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