quinta-feira, 3 de maio de 2012

Cruz Vermelha cria linha direta de ajuda a jornalistas com segurança ameaçada



Enviado por Sandra Lefcovich

Desde o início de 2011, mais de 60 profissionais dos meios de comunicação trabalhando em áreas afetadas pela violência solicitaram a assistência do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). A chefe adjunta de Relações Públicas do CICV, Dorothea Krimitsas, coordena a linha direta para jornalistas em missões perigosas. Ela explica como o CICV pode ajudar.
Quais são os principais perigos que correm os jornalistas ao cobrirem zonas de conflito ou áreas afetadas por outras formas de violência? É mais seguro para eles agora do que antes?
A cobertura da guerra não é mais segura hoje do que antes. Apesar de todas as medidas de segurança adotadas e as precauções tomadas, continua sendo uma atividade perigosa.
O exemplo da Líbia é revelador. “Renomado fotojornalista morto na Líbia”, “Líbia libera jornalistas detidos”, “Repórter independente é atingido em Trípoli” : estas são apenas algumas das manchetes que contam a mesma história. As zonas de guerra são locais perigosos para se trabalhar. Os profissionais dos meios de comunicação que trabalham na Líbia, seja qual for a atividade que exerçam, jornalistas, cinegrafistas, fotojornalistas ou outros; sejam ou não independentes, não são imunes aos ferimentos, sequestros ou morte.
Atos deliberados de violência contra os profissionais da comunicação, que constituem uma violação do Direito Internacional Humanitário (DIH), acontecem, na maioria das vezes, em situações de conflito armado. No entanto, o trabalho dos profissionais da mídia pode ser obstruído de muitas outras formas, por intimidação, censura, ameaças, sequestros ou outras formas de detenção arbitrária. Não parece haver nenhuma melhora na situação.
Os jornalistas que cobrem os acontecimentos do Oriente Médio e Norte da África, desde 2011, não são exceção. De fato, percebe-se que os profissionais da mídia estão cada vez mais em perigo. Estamos muito preocupados com isso.
 
O CICV coleta dados sobre os incidentes envolvendo jornalistas em missões perigosas? Qual o tamanho do problema?
 
O CICV não reúne estatísticas sobre ataques contra jornalistas ou sobre mortes de jornalistas, mas uma série de organizações que tratam da segurança dos jornalistas o fazem. Em uma investigação intitulada “Ataques à Imprensa em 2011”, o Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ) destacou algumas das tendências preocupantes.
Não surpreende a conclusão do CPJ de que as maiores perdas em 2011 ocorreram no Oriente Médio e no Norte da África. “As mortes durante as missões perigosas, como a cobertura das manifestações nas ruas, alcançaram o mais alto nível registrado”, foi a observação do CPJ. Também ressaltou o grande risco enfrentado, em particular, pelos fotógrafos e cinegrafistas, havendo “uma grande proporção de freelancers dentre as vítimas de 2011”, e “o número de vítimas que trabalhava online tem aumentado constantemente”.
 
Qual a proteção que os jornalistas se beneficiam de acordo com o Direito Internacional Humanitário (DIH)?
 
Como destacado no artigo 79(1) do Protocolo Adicional I, os jornalistas são beneficiados pela mesma proteção conferida aos civis. Devem, portanto, ser protegidos e respeitados desde que não participem diretamente das hostilidades. Por força do direito internacional consuetudinário, a determinação é que os jornalistas civis, em missões profissionais em zonas de conflito armado, devem ser respeitados e protegidos desde que não participem diretamente das hostilidades. Esta norma aplica-se tanto em conflitos armados internacionais como não internacionais.
Além disso, “os correspondentes de guerra”, que são as pessoas autorizadas formalmente a acompanharem as forças armadas, têm direito ao status de prisioneiro de guerra ao serem capturados mesmo sendo civis. (artigo 4º A (4) da III Convenção de Genebra).
 
O que o CICV pode fazer para ajudar os profissionais da mídia que trabalham em situações de conflitos armados?
 
O CICV é bastante conhecido pelas suas ações em prol dos civis afetados pelas guerras, mas menos pela ajuda que proporciona aos jornalistas em missões perigosas. No entanto, possui experiência em auxiliar os profissionais da mídia em situações de conflitos armados.
Por solicitação de 16 importantes organizações da mídia, em 1985, criamos uma linha direta para jornalistas em missões perigosas.
 
Poderia explicar qual o propósito da linha direta?
 
A principal finalidade da linha direta do CICV é permitir que nossa organização atue de forma rápida e eficaz, sempre que possível, quando os jornalistas e suas equipes forem presos, capturados, detidos, dados como desaparecidos, feridos ou mortos nas áreas onde o CICV realiza suas atividades humanitárias.
Existe uma variedade de ações que o CICV pode tomar. Pode, por exemplo, buscar confirmação de uma suposta prisão ou captura e obter acesso ao jornalista detido. Ou podemos prestar informações, sempre que estas estejam disponíveis, aos familiares, empregadores ou associações profissionais sobre o paradeiro de um jornalista buscado. Em alguns casos, o CICV pode ajudar as famílias a restabelecerem contato com um jornalista detido ou a evacuar um que esteja ferido. Nos piores dos casos, pode auxiliar na recuperação e transferência dos restos mortais.
 
O CICV pode solicitar a liberação de um jornalista detido?
 
O CICV não solicita a liberação de um jornalista detido nem promove campanhas pela liberdade de expressão ou direito à informação, já que essas questões vão além do seu mandato. A finalidade das visitas do CICV aos detidos é puramente humanitária. A organização avalia as condições de detenção e pede às autoridades melhorias se necessário.  Pode estabelecer um diálogo com as autoridades de modo a assegurar que as garantias processuais e judiciais sejam respeitadas. Igualmente, fornece assistência humanitária quando necessária.
O Comitê, com frequência, age quando ninguém mais pode. Entretanto, é importante notar que os serviços oferecidos por meio da linha direta são estritamente humanitários e que o CICV somente pode fazer pelos jornalistas aquilo que pode fazer por outros civis em situações similares. É evidente que o CICV pode atuar apenas nos locais em que já tenha pessoal no terreno.
 
Qual o procedimento para os jornalistas, suas famílias ou seus empregadores acionarem a linha direta?
 
Eles podem contatar o escritório mais próximo do CICV, ligar para o telefone 24 horas da linha direta +41 79 217 32 85, ou mandar um email para press@icrc.org, para pedir ajuda e conselhos.
Deve-se fornecer dados básicos como o nome da pessoa, data de nascimento, nacionalidade, informações sobre as circunstâncias do incidente, se houver, e o motivo pelo qual se solicita a assistência. Os dados serão transmitidos ao pessoal especializado do CICV no terreno.
 
Quantos pedidos vocês receberam no último ano? Todos chegam pela linha direta?
 
Desde o início de 2011, mais de 60 profissionais da mídia trabalhando em zonas de conflito ou outras áreas afetadas pela violência, incluindo 50 só da Líbia, independentes ou contratados, solicitaram e receberam algum tipo de assistência do CICV.
A maioria contatou as delegações do CICV no terreno por telefone ou em pessoa. Os pedidos para que evacuássemos os jornalistas que estavam aprisionados no Hotel Rixos, em Trípoli, em agosto de 2011, chegaram por telefone, email ou mesmo por Twitter. Na Síria, os jornalistas também usaram o Twitter em um caso, quando não havia nenhuma outra opção.
 
Sempre tiveram sucesso do atendimento desses pedidos? Pode fornecer exemplos?
 
Quando aceitamos um pedido, em geral, explicamos o que fazemos; caso não possamos ajudar, também explicamos o motivo. Para se obter resultados quase sempre é necessária a cooperação de vários membros das equipas envolvidos em diferentes atividades, como visitas às pessoas em centros de detenção, busca de pessoas desaparecidas ou assistência à saúde. Pode ser um processo longo e difícil, que normalmente ocorre longe dos holofotes. Nunca há garantias de que teremos êxito.
No último ano, o CICV conseguiu visitar vários jornalistas em prisões na Líbia, possibilitando, em alguns casos, que mandassem mensagens às suas famílias. Em outros, o CICV contatou as autoridades para conseguir informações. Mesmo um pequeno dado pode ser importante. A confirmação, por exemplo, de que uma pessoa está aprisionada – que está viva – pode trazer enorme alívio às famílias e empregadores que estão preocupados.
Desde que foi criada a linha direta em 1985, ajudamos jornalistas em vários países.
Em junho de 2006, por exemplo, quando um jornalista sueco que cobria uma manifestação em Mogadishu foi morto, o CICV ofereceu seus serviços à Embaixada da Suécia. No dia seguinte, seu corpo era transladado para Nairóbi, junto com quatro outros jornalistas que pediram para serem evacuados.
 
Em novembro de 2006, quando um correspondente colombiano da Telesur foi preso, pelos serviços de segurança do aeroporto de Bogotá, os delegados do CICV o visitaram no dia seguinte da sua chegada à prisão de Barranquilla. Ele foi solto três meses mais tarde.
 
Em março de 2003, após uma batalha perto de Basra, na qual dois jornalistas que cobriam a guerra no Iraque pela ITN foram mortos e um terceiro conseguiu escapar, um quarto jornalista foi dado como desaparecido. Acreditavam que ele estivesse morto, apesar de não haver prova disso. O CICV e o Crescente Vermelho Iraquiano realizaram grandes esforços para localizá-lo, imediatamente após o incidente e durante os anos seguintes – infelizmente, até agora, sem resultados.
 
Porque o CICV não compartilha mais informações sobre os casos que atende pela linha direta?
 
Algumas das ações empreendidas pelo CICV, como a evacuação, em agosto no ano passado, de mais de 30 jornalistas do Hotel Rixos em Trípoli, na Líbia, foram amplamente cobertas pela mídia, mas a maioria dos esforços é realizada sem exposição pública.
Como, por exemplo, quando foi pedido ao CICV que visitasse jornalistas detidos na Líbia e os ajudasse a contatar seus empregadores ou suas famílias; ou na Síria, quando foi solicitada ajuda para evacuar jornalistas feridos.
O CICV trata dos casos que chegam pela linha direta de maneira confidencial, esperando que a recíproca seja verdadeira para aqueles que solicitaram a assistência e receberam as informações. Há duas razões para isso: uma é que a confidencialidade é uma ferramenta-chave do trabalho do CICV, que tem se comprovado eficaz para que a organização ganhe e mantenha a confiança de todos com quem tenha que lidar, para obter o acesso aos locais onde ninguém mais tem permissão para ir. O outro motivo para a insistência do CICV com a confidencialidade é a inserção frequente da organização em situações extremamente delicadas.

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