sexta-feira, 15 de julho de 2011

Islândia usa redes sociais na mudança da Constituição

Por Diogo Bercito, da Folha de São Paulo

O governo da Islândia está aproveitando as redes sociais de internet para uma função inusitada: a escrita da nova Constituição do país, em substituição à atual, de 1944. O conceito, no jargão da web, é o de "crowdsourcing", ou seja, realização de projetos com ajuda maciça de usuários da internet.
No caso da Islândia, isso foi facilitado pelo fato de o país, no norte da Europa, ter população pequena (311 mil habitantes), altos níveis educacionais e praticamente 100% de acesso à internet.
As reuniões da Assembleia Constituinte são transmitidas on-line, e os cidadãos dão opinião nas redes sociais (sobretudo Facebook) a respeito da nova Carta. O resultado dessa colaboração civil será um rascunho entregue em 29 de julho para votação no Parlamento.
Em entrevista à Folha, a primeira-ministra islandesa, Jóhanna Sigudrardóttir, afirma que a experiência trouxe aumento da "consciência a respeito dos assuntos constitucionais" e que "o debate sobre essas temas fundamentais nunca esteve tão vivo".
Entre as questões discutidas pela internet está a troca do sistema semipresidencial (em que presidente e primeiro-ministro dividem o poder) por um modelo parlamentar. "Estou no aguardo para ver como a posse dos recursos naturais será abordada", diz Sigudrardóttir. "É um assunto muito controverso, diante dos nossos estoques de pesca, de certa maneira privatizados no último governo."

MOTIVAÇÃO
Para o economista Thorvaldur Gylfason, 59, a nova Constituição é reflexo da crise de 2008, em que o mercado financeiro do país ruiu.
"Quando todo um sistema bancário entra em colapso, devemos checar as fundações constitucionais das estruturas econômicas e políticas", diz, em entrevista à Folha.
Ele é um dos 25 membros da Assembleia Constituinte, eleitos com voto popular em 2010, entre 522 candidatos.
"Rascunhar uma Constituição pela internet é bastante diferente de quando os legisladores consideravam mais seguro estar fora de alcance."
A participação popular garante, segundo o economista, contribuições nas áreas de domínio de cada cidadão.
Por exemplo, foi incluída a sugestão feita por um policial de que a Constituição torne mais fácil a recuperação de propriedades roubadas.
A primeira-ministra acredita que o apoio amplo da população é essencial para uma nova Carta, "pois [um novo texto] significa um novo contrato social". "Temos todas as razões para envolver a sociedade em todas as etapas."
O produto final desse processo, para Gylfason -que culpa a corrupção bancária e o lobby da indústria pesqueira pela quebra do país- tem de ser como uma "barreira contra governos incapazes".

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